sábado, 17 de julho de 2021

Conversas SBCenses: "O que dá pra rir dá pra chorar"

 

Era mais ou menos previsível que a nossa conversa sobre Marinas, Amélias e Emílias desembocassem  no tema MACHISMOS ESTRUTURAIS

E a conversa foi entremeada por citações de SBCenses de autoras e autores famosos, nossxs condidadxs especiais, que falam sobre o tema, com insights e catarses de mulheres, homens e outros gêneros, sobre o sofrimento e a reprodução (e o sofrimento COM a reprodução) dos machismos diários que vivenciamos.


Margaret Mead, Antropóloga Cultural estadunidense (1901-1978), num dos seus livros "Sexo e Temperamento", de 1935, estudou a vida de três povos primitivos e abriu caminho para a moderna revolução sobre os conceitos tradicionais de feminino e masculino.






Pierre Bourdieu, sociólogo Francês (1903-2002),  elaborou o conceito de Capital simbólico: é o que confere status, honra e prestígio, tratamento diferenciado, privilégios sociais. A soma ou a ausência desses recursos de poder, herdados ou adquiridos, determinará o lugar ocupado por grupos e indivíduos na hierárquica estrutura das sociedades e condicionará seu estilo de vida e suas oportunidades de ascensão. Frase do mesmo, bastante significativa em todos os níveis de relação, do íntimo ao público: "O trabalho do dominador é dividir os dominados"

Dividido em três volumes, História da Virilidade busca retraçar um período esquecido da história. Os livros tratam de virilidade e não de masculinidade, pois segundo os autores, quando se quer fazer a história de estruturas de origem arcaica, definidas pela desigualdade, somente há uma palavra, na nossa língua, que convém, "virilidade".

Os três livros buscam retraçar a história de um apagamento da história... A virilidade é marcada por uma tradição imemorável, não simplesmente o masculino, mas sua natureza é sua parte mais "nobre", senão a mais perfeita. A virilidade é considerada, na história, uma VIRTUDE 



Autorxs: Stéphane Audoin-Rouzeau, Antoine de Baecque, Pascal Ory, Christelle Taraud, Sylvain Venayre, Anne Carol, Arnaud Baubérot, Bruno Nassim Aboudrar, Christine Bard, Christopher E. Forth, Claudine Haroche, Dominique Kalifa, Fabrice Virgili, Tamagn

 


E, muito citada na nossa conversa, foi a Helena Vieira, escritora e transfeminista, seu canal "pausa para o fim do mundo" é tudo de bom, nos ensina muito sobre esses temas tão atuais, assim como seus livros, entre eles:

- História do Movimento LGBT (2018), organizado por James Green e Renna Quinalha 

- Explosão Feminista (2018) - Organizado por Heloísa Buarque de Hollanda 

- Ninguém solta a mão de ninguém (2019) organizado por Tainã Brito.


E outra pessoa que não podemos deixar de citar é a filósofa mexicana transfeminista Sayak Valencia. No seu livro "Capitalismo Gore", lançado em 2010, ela elucida o significado de transfeminismono sentido adotado por Valencia, é um feminismo transversal, interseccional, que inclui todos os outros feminismos e não apenas o feminismo que se dedica à questão da transsexualidade, mas também.

Valência toma o termo gore de um gênero cinematográfico centrado na violência extrema, para descrever a etapa atual do capitalismo em cidades fronteiriças, onde o sangue, os cadáveres, os corpos mutilados e as vidas escravas são ferramentas na reprodução do capital. O lado B da globalização, o lado obscuro da economia global, o contraditório e fora de controle do neoliberalismo é próprio dessas cidades no México, assim como em muitos lugares aqui no Brasil.  E ela caracteriza a violência como uma "nova epistemologia", ou seja, um conjunto de relações que atuam no nosso tempo como práticas discursivas e materiais que se originam no neoliberalismo. Na epistemologia do capitalismo "gore", a violência se instala com um tríplice papel: como ferramenta de mercado altamente eficaz; como meio de sobrevivência alternativo; e como  mecanismo de auto afirmação masculina. "A violência é uma categoria interpretativa transversal às diferentes dimensões de conhecimento e ação, com consequências simbólicas e materiais, pois se converte numa ferramenta de auto afirmação, assim como um meio de sobrevivência". Portanto, o capitalismo gore busca entender como as práticas capitalistas sustentam a violência em todos os níveis de relação, a fim da manutenção do status quo. 

Apresentados xs nossxs convidados especiais (já conversando com elxs, como podem ver), vamos à nossa conversa, com pessoas tão especiais quanto. E, na nossa conversa nenhuma afirmação tem compromisso com uma verdade, digamos, dogmática ou universal. São "considerações intempestivas, como diria nosso grande SBCense Niezsche. Apenas nos servimos de estudiosxs que discorrem sobre o tema, para confrontá-lxs com nossas vivências e reflexões, e amadurecermos trocando experiências. E os comentários, as catarses, as reflexões, não são dirigidas a nenhuma pessoa em especial. São, sim dirigidas a todes nós, a quem se dispuser ao trabalho da reflexão necessária à quebra de padrões aprendidos (e isso exige muito esforço,  e, às vezes, não é sem tristeza) que ensejam o crescimento. E exige também a grande virtude da humildade, tão distorcida (propositalmente) na nossa cultura.  Se na medida em que você for lendo se sentir resistente, não continue... tente refletir, tente escrever, permita que novas ideias te invadam, mesmo que sejam completamente antípodas... exercite a humildade, pois virtudes são aprendidas, e a humildade é a primeira delas, a base de todas as outras ... quem sabe, dialeticamente, criaremos a possibilidade de novas construções para além das nossas referências atuais...

. Já começamos (ou continuamos...) com o comentário: O processo de desempoderamento do homem não acontece  sem reações violentas.  Violência contra xs desempoderadxs,  usada como auto afirmação. Das mais sutis às mais explícitas. 

Quando falta o poder  (quase sempre traduzido no econômico) aparece mais violência. O poder do homem sobre a mulher é naturalizado. Considero que não exista, hoje, possibilidade de relação simétrica, em função do machismo estrutural. 

Quando acontece a simetria (pelo menos do ponto de vista econômico e intelectual) o homem tende a mitificar a mulher (discriminação positiva) e, rapidamente, acha um jeito de desprezar. Sente-se (aqueles sentimentos "inconfessáveis", mas que estão orientando as ações) humilhado|impotente, quando está ocorrendo a simetria. E reage com violência, as mais sutis, "do tamanho de uma patada de elefante" para a mulher que consegue perceber.

. "Ele me ama!? Ele me amava, me admirava... penso numa admiração que anda junto com o amor, e uma outra admiração próxima da mitificação... que (eu sentia) me desumanizava.  Por exemplo, ele dizia “você é uma pessoa completamente resolvida”, será que em nome dessa percepção, ele se colocava como podendo fazer o que  quisesse, toda sorte de reatividades infantis que ele seria “perdoado”, ou "castigado", como faz uma "mãe"?"

. E essa assimetria acontece em todos os níveis de relação. Tenho um exemplo recente da fala de um homem numa situação de seleção para um trabalho: "Éramos quatro concorrentes, eu e mais dois homens e uma mulher, aí ela pegou nossa vaga!".

Os homens se entendem como, naturalmente, merecedores do poder. E isso é tão "inconsciente" que, provavelmente, quase todos eles vão negar. Significa que esse mérito não está no conceito, mas na ação, no automático e irrefletido. 

. Precisamos mencionar que tanto masculino quanto feminino são fenômenos históricos, nada de natureza. Não existe experiência universal da masculinidade, não existe HOMEM nem MULHER. Existem práticas sociais que constituem os sujeitos. Gênero está vinculado a construções sociais, não a características naturais. Se refere a tudo aquilo que foi definido ao longo do tempo e que nossa sociedade entende como papel, função ou comportamento esperado de alguém, com base no seu sexo biológico. E o que foi "estabelecido" na sociedade em que vivemos é que o "sujeito universal neutro" é o Homem; o subalterno é a Mulher; e outros gêneros "menores". Esta é a construção que todes nós recebemos.

. E, acrescentando, Masculinidades são formas diferentes do que se convencionou chamar Homem. Dizendo de outro jeito, são formas de organizar a corporalidade e colocá-la no mundo. O imaginário corporal masculino (o príncipe encantado, Rambo, os "mocinhos" da TV e do cinema) está relacionado a poder, a violência, à dominação, ao sucesso, à competição, ao jogo perde-ganha. Rodrigo Hilbert, por exemplo,  pode ser uma reelaboração do príncipe. E trata-se (as masculinidades) de uma coisa nociva de ser e atuar, para homens e mulheres e outros gêneros, causa dor a todxs, nos violentam, perdemos todxs.

. Numa relação dialógica, quando um tem uma opinião e o outro tem outra, o que se propõe seria buscar a superação  dialética, ou seja, uma elaboração (ou uma construção), uma terceira teoria|opinião que seria diferente das duas anteriores e, ao mesmo tempo, conteriam as mesmas. Porém, essa relação dialógica pressupõe SIMETRIA. E é exatamente isso que não conseguimos, ainda, no nosso mundo machista. O homem, na situação de simetria, sente-se acuado e, reativamente (e "inconscientemente") entra em luta de poder... pois ele foi "educado" por séculos para o lugar de "dominador", ele "nasceu pra isso" a mulher pode não perceber esse jogo de imediato, e também o repete  – e o jogo se transforma em perde-ganha, e desemboca,  ao final, no jogo perde-perde. Ambos perdemos.

. Depoimento de uma mulher: "Sim... percebo isso. O que eu estava tentando era instigá-lo para a construção, e o resultado foi a tragédia... a separação".

. Já ouviram falar de "Novas masculinidades"? e como elas se organizam historicamente? Por exemplo, os "hipsters". Trata-se de uma palavra inglesa usada para descrever um grupo de pessoas com estilo próprio e que habitualmente inventa moda, determinando novas tendências alternativas. 

O termo deriva de “hip”, um adjetivo inglês usado desde a década de 1940 com o significado de “descolado", "inovador". Foi inicialmente ligado à música e ressurgiu nos anos 1990, sendo então associado não apenas à música independente mas a outras formas de expressão artística   (cinema, literatura, design, moda, artes visuais), afinal definindo um estilo de vida alternativo, baseado em padrões estéticos, de consumo e de comportamento não convencionais ou não perfeitamente identificados com a cultura de massa. Acreditem, essas tendências alternativas não necessariamente transformam as práticas sociais de gênero, apenas reproduzem novas formas de dominação, são novas práticas no disco velho. 

. A psicanálise, falando de  como se dá a construção do sentido do EU - o universo psíquico interior -  para os homens, diz que o rompimento edípico está relacionado ao desprezo pela mulher, ao rechaço. Daí me ocorre uma pergunta fundamental: como essas representações interferem nas relações dos homens, desde as relações intimas, família, trabalho e cidadania, todos os níveis de relação,  e podem causar dor e sofrimento?

. Acrescentando a este questionamento: penso que não existe masculinidade saudável ou tóxica: se a sua masculinidade provoca dor, em vc mesmo e|ou no outrx, então ela deve ser revista.

. Já outras pessoas veem o conceito de "masculinidade tóxica"  útil para popularizar os entendimentos sobre como os homens têm construído suas vivências de modo nocivo, e os impactos dessa construção. É um termo mais acessível do que "masculinidade hegemônica". Aos homens é ensinado uma falsa percepção de vantagem no exercício de uma vivência baseada na violência, no individualismo e na ausência de auto reflexão emocional. Ou seja, a masculinidade torna-se incompatível com a vida comunitária e produz prejuízos de diversas ordens aos próprios homens e a não-homens: mulheres, LGBTQIA+, crianças e idosos. 

Mas não podemos perder de vista que a masculinidade, na sua essência, está ligada ao exercício de poder, e não dá para tratá-la apenas pelos seus efeitos tóxicos. Sua construção opera de modo normativo, binário e hierárquico, a partir da interseção de marcadores estruturais de dominação: o racismo, o sexismo, a LGBTQIA+ fobia, as questões de classe, geração e território. Eu confesso que tenho muita precaução, desconfiança mesmo,  com homens que se dizem "machistas em desconstrução". Pois conheço alguns que dizem isso "da boca pra fora", às vezes até para seduzir...  o que as mulheres dizem do "machista de esquerda", tem tudo do "machista de direita", só que é "fofo", "caímos facilmente". Falta o desejo genuíno do trabalho, do esforço necessário para tal empreitada. Do mesmo jeito que temo, também, pessoas (em geral, brancas, ou "embranquecidas") que se dizem não preconceituosas, não racistas. Falta a "consciência possível", o "se ver", admitir que estamos inseridxs nessa sociedade que reproduz essas relações de poder. Ou seja, o primeiro passo para qualquer desconstrução é a humildade de "se ver, humanamente". 

. Já "masculinidade hegemônica" e "dominação masculina" são termos quase sinônimos, no nosso entendimento. O termo "hegemônico" deriva da teoria da hegemonia cultural, do teórico marxista Antonio Gramsci, que analisa as relações de poder entre classes sociais numa sociedade. Assim, no termo "masculinidade hegemônica", o adjetivo "hegemônico" se refere à dinâmica cultural por meio da qual um grupo (no caso, os homens) reivindica e sustenta uma posição dominante em uma hierarquia social. Conceitualmente, a "masculinidade hegemônica" propõe-se explicar - e legitimar - a posição dominante do homem, ou seja, como e por que os homens mantém papéis sociais dominantes sobre as mulheres e outras identidades de gênero que são percebidas como "femininas" em uma determinada sociedade. Daí a semelhança com a "dominação masculina".

. E este "modelo masculino" atinge as "masculinidades subalternas", que se transformam em aliadas do "patriarcado branco hegemônico". Ou seja, trata-se de uma construção interseccional das masculinidades: são diversos discursos (colonialismo, racismo, neoliberalismo, entre outros) que produzem desumanizações. A cooperação entre estes diversos discursos confluem na constituição das distintas formas de ver o mundo, de se expressar e de exercer poder sobre o dominado (ou visto como subalterno, no caso, a mulher).

. E luta de poder é, sem dúvida,  uma característica marcante da Masculinidade Hegemônica (ou Dominação masculina) e outra coisa que precisamos conversar é que as mulheres caem facilmente nessa armadilha.

Depoimento de uma mulher: Sim, eu também, me vejo exercendo a "masculinidade tóxica". Ou seria "feminilidade tóxica"? A gente também entra em luta de poder. Esse "poder sobre", que pressupõe relações assimétricas, o poder de dominação. Já me falaram que existe a possibilidade da construção de uma outra noção de poder, o "poder para", que pressupõe relações simétricas, o poder de construir relações mais bonitas. Será que a gente consegue chegar a construir essa noção de poder? pelo menos começar? no nível micro e macro, "na cama e no mundo", conseguiremos redefinir, resignificar, e praticar outra noção de poder?  

. Me ocorre novamente a imagem (e a estória) de Lilith. Leiam nosso post de 07.março.2016. Liliths, no nosso entendimento, são mulheres auto afirmativas. Nós temos uma matriz feminina dupla: Liliths e Evas, até mesmo não conhecendo  a Lilith. Quando ouvi, pela primeira vez, a história da Litith, fiquei emocionada, foi como se descortinasse uma  visão de mundo, o questionamento de tudo que eu "fui educada para" se contrapondo a uma "força interna" que eu reconhecia agora,   me identifiquei imediatamente com ela.  Eva é a subalterna, a que foi feita da costela de Adão. Lilith é a questionadora do “status quo”; e dos padrões. E os homens têm a matriz única: Adão.  E eles dizem: eu quero dar conta de “Litilhs”. Mas, ao primeiro conflito aberto sobre as “sutilezas do machismo” eles, inteligentemente|burramente,  invertem o jogo e dizem que está sofrendo desrespeito, sofrendo relação abusiva... e, defensivamente, podem até  terminar uma boa relação (até então...), não sem sofrimento, e sim para se manterem “fiéis às suas verdades”... como eles mesmo dizem: “sempre sou eu que termino as relações”.

. Interessante o "inteligentemente|burramente". Falamos da "inteligência emocional" que, de uma maneira simples para compreensão, seria juntar cabeça com coração, com corpo, ou seja, "perceber" suas emoções e aprender a lidar com elas. É preciso pontuar a diferença entre a pessoa que usa da história, da ciência, da filosofia como "teorias abertas", úteis para se conhecer e conhecer o mundo, elas elaboram suas próprias "teorias orientadoras da ação"... e a outra pessoa que usa todo esse conhecimento para reafirmar seus estereótipos, seus machismos...

. Depoimento de uma mulher: Liliths querem, reivindicam, o que elas tem direito. Dizem que o  orgasmo feminino é aprendido. E, quando elas fazem um boquete, elas sentem prazer fazendo! E, quando um “homem sensível” faz um boquete ele se vangloria: olha que boquete perfeito! Querendo ser “incensado”, agradecido por isso, querendo “biscoito”! assim como quando varrem uma casa ou cuidam de um filho: olha como eu varro bem, olha como sou o melhor pai do mundo! 

. Depoimento de um homem: Vocês sabem, eu sei e gosto de cozinhar... então eu me vejo como o melhor cozinheiro do mundo, melhor do que qualquer mulher... mesmo que saiba que elas “nasceram para isso”. Verdade, me falta humildade, entro em competição – luta de poder – a gente confunde humildade com humilhação, com baixa-estima – então, reativamente, assumimos a postura arrogante – o que, reconheço, essa arrogância é naturalizada, faz parte do nosso jeito de ser, temos o “direito” a ela. E mais, conheço alguns amigos que tem o comportamento do “falso humilde”. Lembram do Chapolim? "eu sou perfeito! antes eu não era humilde, mas aprendi a ser... agora eu sou perfeito...

. Lembra, às vezes ao avesso, um comportamento que, na psicologia,  chamamos de  passivo-agressivo: é a expressão indireta de hostilidade, que pode ocorrer por meio de procrastinação, sarcasmo, piadas hostis, teimosia, ressentimento, mal-estar ou falha deliberada ou repetida para realizar tarefas. Ele tem, quase sempre o comportamento de se opor, "dis-por", ele quase nunca "põe". Ele resiste passivamente, igual a um camaleão ("com a cabeça diz que sim, com o rabinho diz que não").  Uma amiga me contou, certa vez, que combinou com o marido, ela faria uma dedetização necessária e ele trocaria um chuveiro estragado. Ele concordou, ela fez a parte dela e esperou uns três meses. E então foi cobrar dele o combinado. E ele lhe respondeu: eu combinei mas não tinha a intenção de fazer. Você é muito autoritária!... foi o início de uma separação...

. E, voltando à Marina, o depoimento de uma mulher: "de uma discussão sobre esta música, ele queria me mostrar como a Marina era libertária, independente, teimosa, se pintava,  mesmo que o homem se aborrecia. E eu queria mostrar para ele que isso não estava contido na letra, pode até ser que existisse algumas Marinas libertárias, mas a música traz um sofrimento para a maioria das mulheres porque resulta na nossa tentativa de ser "do jeito que o outro queria", para sermos amadas. A música contém tanto o estereótipo feminino quanto o masculino, engraçado, ele não falava do perfil do homem dessa música... o relevante da música, no meu entendimento, foi o mal que ela causou para as inúmeras mulheres, no sentido do esforço para o desempenho dos papéis femininos "subalternos", e eu queria mostrar a ele o "lugar de fala", num sentido genuíno desse termo, seríamos NÓS, mulheres, que devíamos falar de nós, ele devia falar do homem da música. 

E isso desencadeou uma luta de poder, uma briga para ver quem tinha razão: eu queria mostrar a ele que, mesmo compreendendo a sua interpretação da Marina, este era meu "lugar de fala" - dizer da repercussão dessa música na vida das mulheres;  e ele entendeu - e se ofendeu - que eu não estava respeitando a sua opinião. É isso, chegamos ao "chumbo trocado não dói"... mas "dói demais!".

. E terminamos cantando a bela música de Billy Blanco, CANTO CHORADO:


... e com a pergunta: existe a possibilidade da construção de um novo conceito de PODER, que possa orientar nosso pensar, sentir e agir, orientar para a construção de relações mais bonitas, mais simétricas, mais prazerosas, em todos os níveis de relação, "na cama e no mundo" ? 
Que autores buscaremos para refletir e discutir sobre isso? e, principalmente, para construirmos na prática...

Abraços a todes.
Santuza TU



 

8 comentários:

  1. Ótima a continuidade. Vários autores(as)buscaria, aliás tenho corrido atrás. Sou meia que agarrada em Judth Butler, Foucault, Hanna, mas já temos uma contemporaneidade para espiar. E o foco na questão mais próxima da gente. Somos Brasil. Eu me afino com Márcia Tiburi. Parabéns, Santuza!

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  2. Muito bom Tuza.Eu já via este machismo desde o tempo da Amelia(mulher de verdade) mas cadê Amelia?

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  3. Texto excelente e esclarecedor em relação a questões que, muitas vezes, intuímos, mas falta embasamento quando nos deparamos, dioturnanente, com situações que tentam nos colocar em posição de subalternas ou subjugadas, seja na fala ou nas ações daqueles que se apresentam como progressistas/esquerdomacho. Parabéns e obrigada

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    1. Isso mesmo! Os micromachismos são mto sutis.
      Abraços e obrigada

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  4. Excelente reflexão. Para ler, reler e compartilhar.

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