sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Natal SBCense: arte, amor e política

  


Então é Natal... Me disse uma SBCense que começou a gostar do Natal quando descobriu que Jesus foi um super socialista... o capitalismo foi que apropriou dessa celebração, e a distorceu, descaracterizou ... mas nós, SBCenses, recuperamos e resignificamos essa data. Há que se comemorar, sim, o "AMOR ao próximo como a ti mesmx". 

Na 'toada' do filme ARGENTINA 1985 vimos e comentamos outro filme que tem a mesma data 1985 no título... e como é importante trazer a década de 80 para a atualidade e conversar sobre isso!


O ano de 1985, filme de 2019 sensível, humano e bem dirigido por Yen Tan, uma expansão do seu curta-metragem homônimo: Morando em Nova York e longe de casa há três anos, o jovem Adrian retorna para passar o natal com sua família, durante a primeira onda de crise da Aids. Sobrecarregado com uma tragédia recente, o jovem procura se reconectar com sua amiga de infância, seu irmão mais novo e seus pais religiosos, enquanto luta para revelar seus segredos - esta é a sinopse do filme. 

Ambientado no conservador Estado do Texas em 1985, o filme é estrelado por Cory Michael Smith como Adrian Lester, um homem gay que voltou para casa para contar à sua família que estava morrendo de  AIDS.  O jovem que havia se mudado por conta do trabalho, após alguns anos reencontra a hostilidade de normas sociais rígidas que anulam qualquer esboço de alegria natalina ou manifestações positivas relacionadas à saudade.

"A época das festividades de dezembro, a alegria natalina, a esperança por um novo ano ou a reunião familiar após anos de desconfortável silêncio e cisão não acalmam o turbilhão que agita a superfície aparentemente calma daqueles quatro rostos ao redor da mesa de jantar, pai, mãe, filho e o outro filho... E conforme as horas se transformam em dias e os dias se transformam em horas de uma nova despedida, a dor inevitável retorna, a mágoa inevitável, e também a breve felicidade inevitável".
O preto e branco do filme é pertinente. A ambientação de luz baixa reforça a aridez do antigo lar de Adrian. É uma atmosfera que faz "bloquear" a felicidade, o bem estar, mesmo no Natal. 
Por outro lado, nos toca muito, no filme, a "humanidade" das pessoas. Por exemplo, o pai conservador:  Se o pai de Adrian e do pequeno Andrew personifica o que é conhecido como masculinidade tóxica numa sequência como a das cervejas compartilhadas de madrugada, ele pode, logo em seguida, demonstrar-se disponível emocionalmente para o filho mais velho, ajudando-o no que for preciso, custe o que custar. Refletimos sobre "humanidade": nos reconhecer humanxs é exatamente nos reconhecer preconceituosos e preconceituosas, machistas, racistas... pois vivemos numa sociedade que alimenta isso! e, para evoluir, precisamos assumir nossos preconceitos, pois só assim poderemos repensá-los e caminhar para combatê-los. 
Diz um SBCense: "morro de medo de pessoa que diz "Não sou preconceituosx, não sou machista, não sou racista"... pois ela, ao negar, apenas não fica sabendo dos seus preconceitos - e não vai aprender  a lidar com eles! 
Isto é se desumanizar,  acrescenta outro SBCense, ou seja, se considerar "perfeitx". O "maniqueísmo" de se ver e de ver o mundo na polaridade -  ou perfeito ou "o nitrato do pó da bosta do cavalo do Napoleão" - e mais, quem não é perfeito, igual a mim, deve ser "condenado", "perseguido"... a quem interessa esse jeito de pensar?
E, de uma maneira mais "inconsciente" (ou mais "explícita"), não "aprendemos" a pensar dessa forma? É isso, precisamos muito nos conhecer e sabermos o que combater e o que alimentar em nós mesmxs... 
A mãe , no filme,  é como a maioria das mulheres da época, tanto lá como aqui no Brasil, -  uma dona de casa e mãe devotada que segue as regras impostas pelo marido - mas também está à beira do seu despertar de consciência, enquanto ser humano e enquanto mulher. Claro que, sendo o SBC intergeracional, temos mulheres que lembram muito bem dessa época, anos 80, como uma época do "despertar da consciência política mais ampla através da consciência de gênero, ou seja, das violências que sofremos, das micro violências até o feminicídio". 
Lembramos do filme Gaslight, de 1944, que deu origem ao estudo sobre algumas micro violências, quase "imperceptíveis",  mas que vão nos "apagando", diminuindo nossa auto estima e nossa participação no mundo. Veja nosso post de 01 de março de 2016: Conversas SBCenses: O machismo nosso de cada dia,  onde conversamos sobre esse tema. Veja também nosso post de post de 28 de junho de 2018: Sobre livros, filmes, músicas... e vidas, onde contamos a história de 'mulheres maravilhosas' do século passado que narram suas histórias e seu processo de tomada de consciência. 
Voltando ao filme O ano de 1985, as cenas da relação entre Adrian e Carly são, também, brilhantes  Enquanto ex-namorada de colegial do Adrian, a agora comediante stand-up coreano-americana, Carly ressurge na vida de Adrian,  ora como uma espécie de antagonista por ter sido abandonada no passado e ora como aliada, por aos poucos descobrir o que ele sempre escondeu, a homossexualidade.
E  nossa querida SBCense não pode deixar de indicar um outro filme da Netflix, documentário brasileiro que trata do assunto HIV e AIDS e  trás o assunto para a atualidade:

Lançado em 2019, este documentário narra a evolução do vírus HIV no Brasil ao longo de três décadas e mostra o estigma imposto a quem vive com a doença. O título é baseado numa crônica do Caio Fernando Abreu publicada no Estado de São Paulo. 
A epidemia da AIDS, da década de 80 do século passado,  'escancarou' ignorância e preconceitos. Dirigido por André Canto, o filme investiga o estigma e a discriminação como produtos de uma sociedade que insiste em manter marginalizadas as pessoas que vivem com HIV. Até hoje, passados mais de 30 anos, muitas ainda enfrentam situações de medo, insegurança e de exclusão. 
Pois na Europa, relata nosso SBCense,  foi feita uma pesquisa que mostrou que homens com HIV estão  vivendo mais do que os outros, em função do acompanhamento médico constante. O 'tratamento' se resume a dois comprimidos ao dia, como, por exemplo, para um hipertenso ou um diabético. No entanto, se consideramos o recorte de classe social e etnia. essa pesquisa, aqui no Brasil, se aplica a pessoas de classe média pra cima. Com as pessoas pobres, a maioria negras, o HIV evolui ainda para a tuberculose e AIDS. 
Daí concluímos: a pobreza mata! o preconceito mata! a falta de politicas públicas mata!  E sobre isso precisamos falar...no NATAL!!! e em 2023... FALAR e AGIR...
Terminamos lembrando Titãs com Elza Soares...

A GENTE NÃO QUER SÓ PÃO... QUER PAZ E POESIA!!!
A GENTE NÃO QUER SÓ COMIDA... QUER COMIDA, DIVERSÃO E ARTE!!!
 

E nos desejamos, e a todos que nos seguem,  um Natal profícuo, cheio de reflexões (e ações) para 2023: um ano de ESPERANÇAR, como diria Paulo Freire. 
AMAR E MUDAR AS COISAS, grande Belchior... o que vem a ser, para nós,  o mesmo que AMAR E FAZER POLÍTICA...
Abraços carinhosos a todas, todos e todes...


terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Conversas SBCenses: para que serve a ARTE?

Nos reunimos para conversar sobre o Natal... mas  no SBC conversamos muuiiittoooo... e, às vezes, "desviamos" anarquicamente do tema... porém, só conversa boa, que merece ser compartilhada.

Aconteceu uma pergunta inesperada, mas inteiramente pertinente aos questionamentos SBCenses: PARA QUE SERVE A  ARTE?

Depois de inúmeras respostas possíveis, nosso querido SBCense compartilha resumo de live da Rita von Hunty - esta da foto, pra quem não conhece ainda, personagem de Guilherme Terreri Lima Pereira, professor, ator, You Tuber, palestrante... e drag queen que dá aulas de política.

Rita diz, ou melhor, nosso SBCense diz: PARA NADA! ... se entendermos "servir"  como "ser útil" ao consumo, ou seja, a arte não deve ""se submeter", ser subserviente a uma cultura do consumo, a uma sociedade onde o dinheiro ganha vida e nós nos transformamos de sujeitos a objetos (consumistas: que só consomem - e se deixam consumir). Por outro lado, a ARTE pode (e deve) servir para ajudar a causar perplexidade, estranhamento, para abrir perguntas e incitar o raciocínio  - e ação -  transformadores. Aí a arte cumpre com seu papel: o de ser, sempre, um LEVANTE contra a servidão.

A Arte pode nos JOGAR LUZ na NORMA, nos ajuda a questionar aquilo que se coloca como  NORMAL... e descobrir o que existe nessa normalidade. Em outras palavras, o interesse em se impor como NORMAL - ou NATURAL, ou INQUESTIONÁVEL, ou AHISTÓRICO significa TENTAR NOS IMPOR modelos prontos de vida, significa o AUTORITARISMO, significa, ainda, nos colocar na passividade, na submissão ao modelo pronto e acabado... o contrário do que queremos enquanto sujeitos... e enquanto sujeitos históricos, construtores da própria vida e de um mundo melhor.

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Nessa toada vimos o filme mais comentado do ano: Argentina 1985: 

Lançado em setembro desde ano, o filme Argentina 1985, conta a história verídica dos promotores públicos Julio Strassera e Luis Moreno Ocampo que ousaram investigar e processar a ditadura militar mais sangrenta da Argentina em 1985. Strassera e Ocampo reuniram uma equipe jurídica jovem e cheia de heróis improváveis para enfrentar a influência dos militares na época, para uma batalha no estilo de Davi contra Golias. Esse julgamento histórico revelou horrores da ditadura na Argentina.

O longa foi filmado nas locações históricas reais, sob a direção de Santiago Mitre, que também assinou o roteiro ao lado de Mariano Llinás. Ricardo Darín e Peter Lanzani protagonizam o filme, nos papéis dos promotores Julio Strassera e Luis Moreno Ocampo, respectivamente.

- "AI... O Darín...", comenta SBCense famosa: "A pessoa tem que ser bonita por dentro e por fora, até que por fora para além dos padrões de beleza... mas a beleza interna, suas posições na vida, nas relações, na política, a tornam bonita! Tem gente no SBC que "casa" com ele a hora que ele quiser (as românticas...). Já outrxs "dão" (ou dariam... péssimo trocadilho, aff) pra ele até 'penduradxs no lustre'... 
Mas peguem qualquer filme que ele atua, protagonizando ou em papéis secundários ... TODOS são ótimos! e agora temos sua versão mais nova, o filho CHINO DARÍN, vejam A ODISSÉIA DOS TONTOS, os dois atuando juntos, o mais velho, o Ricardo💖 diz sobre este filme: “Somos tão domesticados, tão acostumados a obedecer e seguir a corrente de uma sociedade de consumo que às vezes esquecemos quais são os nossos direitos. Nunca se deve baixar a guarda na defesa dos direitos. Os abutres sempre estão à espreita para se aproveitar de pessoas crédulas, ingênuas e decentes. Essas pessoas que trabalham e que movimentam o mundo”.

Tivemos que interromper nossa SBCense famosa, pois ela queria ficar falando sobre os DARÍN a noite toda... e nós queríamos comentar o 1985:

"Poucos dias antes de 22 de abril de 1985, o juiz Ricardo Gil Lavedra encontrou um colega no Palácio da Justiça de Buenos Aires e, depois de conversarem sobre assuntos corriqueiros, o outro magistrado perguntou incrédulo a ele: "Me diz uma coisa, vocês realmente vão fazer esse julgamento?" "Esse julgamento" sobre o qual o colega de Gil Lavedra perguntava não tinha outros precedentes na história do século 20 além do julgamento de Nuremberg, que ocorreu entre 1945 e 1946, sobre os crimes do nazismo, e de um julgamento de 1975 contra coronéis gregos que lideraram o golpe de Estado no país em 1967. Na Argentina, tratava-se de julgar em um tribunal civil os nove líderes das três primeiras juntas militares que governaram o país após o golpe de Estado de 1976, por crimes que iam desde homicídio e tortura até privação ilegítima de liberdade. Organizações de direitos humanos estimam que 30 mil pessoas desapareceram durante aqueles anos."


Um pequeno panorama da América Latina nessa época: "No Chile, Pinochet tinha todo o poder; o Uruguai, por referendo popular, se recusou a investigar seus militares; havia oficiais militares em muitos governos da região, e a Argentina — como sempre oscila entre o abismo e o topo — fez algo totalmente inesperado."
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Recorte para cumprimentarmos nossos "hermanos" pelo tri... Parabéns para a Argentina, parabéns para a América Latina!
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Voltando a reflexões a partir do filme... E o Brasil? José Sarney, primeiro presidente civil após a ditadura militar no Brasil desde o golpe de 1964, o Congresso se articulava para a construção da nossa Constituição de 1988. Aí veio Collor, primeiro Presidente eleito pelo voto popular depois de 25 anos de regime de exceção... dois anos depois o impeachment... o vice Itamar assume... Depois o Fernando Henrique... e, em 2003, o Lula... reeleito... depois a Dilma... e o GOLPE. Temer, vice de Dilma, assumiu o governo e abriu campo para a eleição, em 2018, de regime de ultra direita, que se alia aos militares para a retomada de projeto autoritário e corrupto.
O Brasil não teve um julgamento de militares que estiveram envolvidos em torturas. A Lei da Anistia, de 1979, anistiou pessoas exiladas e também militares. Em 2011, no governo Dilma,  uma Comissão Nacional da Verdade foi criada e investigou fatos do período militar. Mas, por causa da Lei da Anistia, não houve um julgamento com punição a torturadores. Essa Lei deixou muitas feridas abertas na memória brasileira, pois vítimas de tortura não encontraram sua reparação e ao mesmo tempo seus torturadores foram anistiados e não sofreram consequências por seus atos hediondos. A consequência disso é que tivemos uma justiça de transição falha no Brasil e muitos não tiverem o direito por Memória, Verdade e Justiça garantidos. Isto faz com que vejamos, ainda nos tempos atuais, homenagens a torturadores, comemorações do golpe de 1964,  manifestações que defendem o AI-5 e clamam por intervenção militar.

A Comissão da Verdade de 2011 teve importância na história brasileira: tentou reconstruir a história, fez a  tentativa de restabelecer os fatos históricos. Porém, sofreu intensos ataques, demonstrando o problema de um país que não lida com um passado marcado por violências e atrocidades cometidas pelo próprio Estado. Concessões foram feitas para acomodar uma insatisfação em parte dos integrantes da elite das Forças Armadas do país. "Idealmente deveríamos ter alcançado o maior grau de aprofundamento nessa questão e tratado o tema de forma mais aberta e transparente para a sociedade". E o que estamos presenciando nesse fim trágico de governo, de uma maneira direta, são as consequências dessa história. 

Daí a importância do filme Argentina 1985 para nós, para a nossa memória. Muitos jovens (e não tão jovens), agora, consideram que a democracia é dada, não se lembram da ditadura, acham que é algo "pré-histórico" quando foi "outro dia" para as pessoas que nasceram no século passado.  Em países sul-americanos, como em outras partes do mundo, vemos muitos jovens reproduzindo discursos reacionários e reivindicando governos ditatoriais. 

"Há uma batalha cultural que está se perdendo com o tempo. A sociedade não consegue responder. A Alemanha, por exemplo,  continua falando de nazismo nas escolas"... o filme, portanto, é essencialmente educativo, ou seja, serve de pré-texto para inúmeras 'rodas de conversa' ou ' centros socialistas' como diz nosso jurista Alysson Mascaro - AI... outro feio/lindo, que SBCenses fariam com ele que nem com o Darín. Precisamos entender o que aconteceu durante a ditadura e aprendermos mais sobre democracia e sobre sermos sujeitos dessa construção, pois é a única maneira de não repetirmos essa triste história.

Terminamos nossa conversa com Gonzaguinha:


E nos prometendo fazer outra reunião de reflexões sobre o NATAL e ANO NOVO...


Abraços carinhosos a todas, todos e todes..



 

 



segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Infâncias, loucuras e carnavais SBCenses


Vale: entre a carência social e a riqueza cultural.... "Rio largo cheio de peixes" é o significado da palavra Jequitinhonha, de origem indígena.

Conversas sobre o Vale do Jequitinhonha sempre me remetem à infância. E, lembrando da infância no Vale, começo a conversar com tia querida, e ela lembra de doidos e doidas da sua cidade. Parece que em toda cidade do interior, "no século passado" (não sei como é agora...), tinha uma doida e/ou um doido...  as crianças, não sei bem porque, adoravam brincar com eles e elas. Talvez agora isso fosse considerado um bulling, ou não politicamente correto, mas o fato é que, "naquela época", nós tínhamos um misto de pilhéria e carinho por essas pessoas. 

A tia lembra de muitas doidas e doidos... e conta e ainda morre de rir:

. Tinha o Colete Preto (ele odiava ser chamado assim, embora só andasse com o colete preto): muito religioso, acompanhava todas as procissões cantando Ave, Ave, Ave Maria! La La La La La La La La La La La La  (são 12 Las, formando a melodia)... e, no final do Ave Maria, ele ouve de um garoto: Colete Preto!... continuando a canção, no mesmo tom, ele responde: Co Le Te Pre To É A Pu Ta Que Pa Riu...

Nossa querida SBCense Antonieta se encanta com o tema e manda o texto:

"A Maria diz que tem sete saias de filó.                                             
É mentira da Maria ela tem é uma só. "                                   
Este é um pedaço de uma música que a meninada sempre cantava correndo atrás de uma moça que andava pelo bairro onde eu morava quando criança.
Maria estava  sempre suja, maltrapilha, faminta, entretanto, sempre cantando. Sobre Maria, ninguém sabia nada. De onde vinha ou  para onde iria. Quem eram seus pais, se tinha irmãos ou parentes. Sabíamos apenas que ela estava sempre por ali. Para nos amedrontar, nossas mães sempre falavam: "A Maria vai te pegar e vai colocar você debaixo das saias dela." Era uma ameaça que sempre escutei enquanto era criança. Por isso, talvez, como uma forma de nos proteger, sempre que a víamos, cantávamos a musiquinha . Ela então ficava irritada e fugia para bem longe.
Passávamos dias sem ver Maria. Até que, sem mais nem menos, ela aparecia.
 Me lembro sempre a música que Maria cantava:
"Se você pensa que meu coração é de papel, não vai pensando  pois não é. Ele é igualzinho ao seu e sofre como eu, para que fazer chorar ao léu, meu coração que não é de papel." 
São lembranças de uma infância feliz. Entretanto algumas interrogações  até hoje ficaram como interrogações. Quem era Maria? Por que ela vivia cantando sempre a mesma música?
Por que as pessoas adultas não ajudavam aquela pessoa sair daquela situação? O que foi feito de Maria?
Nunca soube. E por muito tempo esta lembrança ficou guardada no fundo da minha memória. Até que um dia, no nosso sarau as quartas feiras no ASA DE PAPEL,  a amiga Santuza, lê o poema do MASCATE DE METÁFORAS (como ele mesmo se intitula) Caio Duarte, adivinha de onde ? Claro, do Jequitinhonha, nasceu em Almenara mas viveu, desde a infância, na cidade de Jequitinhonha:
 



É estranho que antes mesmo dela ler o poema, Santuza fez uma breve introdução falando exatamente dessas pessoas que marcam as nossas infâncias normalmente em cidades do interior. E ela estava  certa.
Se eu tivesse, hoje, passado tantos anos, a oportunidade de encontrar com aquela Maria da minha infância, eu talvez cantasse outra música. Talvez a música do Milton Nascimento:
 


Não cantei! 
Entretanto, eu gostaria que, onde Maria estiver,  ela saiba que ela fez parte da minha história.

A 'doida' da Antonieta é a Maria, a do Caio é a Clarice.  Temos, também, outra 'doida' Maria, do Tadeu Oliveira Romão, que nasceu em Corinto mas é jequitinhonhense de coração:
 
MARIA, COMO TANTAS MARIAS

“Maria... Maria... Há tantas Marias...
 Maria da Penha... Maria da Glória... 
 É tudo Maria!
 Há tantas Marias!
 E  foi só Maria, a Santa Maria,
 A Mãe da pureza,
 A Mãe da bondade, 
 A Mãe da justiça,
 A Mãe das Marias!...”
 (POEMA DAS MARIAS, Caleidoscópio, Pérola S. Gandra) 
 
 Ela estava sempre presente nas rezas de terços em igrejas ou na casa de algum devoto de Maria, mãe de Jesus, juntando suas preces com as preces de outras bocas, num bater ligeiro de lábios e num tatear de contas gastas do seu rosário, roçadas pelos dedos inábeis e rústicos. Ela era assim! Não perdia missa, terços, ladainhas, procissões, batizados, velórios e na Semana Santa engrossava, com sua voz desafinada e destoante, o coro formado pelas mulheres que respondiam ao canto responsarial da Verônica, em latim, na procissão do enterro do Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas para falar a verdade, creio que se ainda houvesse carpideiras na cidade com certeza ela seria uma e das melhores.

Seu entretenimento preferido era bater perna pela cidade inteira. Os trajes, quase sempre os mesmos: lenço na cabeça, blusa de mangas compridas ainda que o sol estivesse a pino. A saia de cor sóbria, frisada e desbotada, se estendia abaixo dos joelhos. Sob os pés rotos, carcomidos nos calcanhares devido às suas andanças, um velho par de havaianas. Como complemento trazia sempre debaixo do braço, fazendo chuva ou sol, uma sombrinha e um saco plástico onde, presume-se, levava seu cabedal. 

Não há muito que falar das suas feições cansadas. Lembra-se daquele personagem da Escolinha do Professor Raimundo, o aluno Baltazar da Rocha? Pois bem, a verossimilhança com o tal, como era tamanha! Há de se ressaltar que, enquanto aquele sempre trazia uma boa piada na ponta da língua, ela trazia um afiado palavrão para quem se atrevesse a lhe mangar. E, quase sempre, uma saraivada de impropérios impublicáveis, contraditórios às palavras sacrossantas rogadas de sua boca. E isto era o que mais acontecia porque a molecada e até mesmo muitos marmanjos desprovidos de autocrítica e comiseração, incontinenti dirigiam-lhe os dois pseudônimos que lhe funcionavam como ofensas mortais: “Maria Beú” ou “Maria Fubá”. 

Seus xingatórios explosivos e esfuziantes eram direcionados às genitoras dos caçoadores e, caso insistissem, partia para o ataque corporal. Fosse quem fosse, dava uma carreira atrás do desafeto e quando o alcançava, cobria com pancadas de sombrinha. Sem contar as pedradas, nem sempre certeiras.
Parece que ninguém se acostumava com ela e nem ela com ninguém. Quando pequeno sempre a via com as mesmas atitudes e com os mesmos olhos. E a minha condição de pequeno moleque nunca me impediu de zombá-la, o que me custou muitas carreiras e muitas surras de meus pais, quando flagravam meus inocentes delitos. Porém, adulto, amadurecimento perante as coisas do mundo não me permitia cogitar importuná-la.

Vez ou outra aparecia num bar como quem não quisesse nada, só para filar uma caninha, sua bebida preferida. E ficava insolente se lhe negassem um gole. Afinal, diziam, como derramar o líquido impuro sobre a hóstia sagrada? É que ela tomava quase que diariamente a sagrada comunhão. Quando alguém mais apiedado agia com generosidade, num átimo os seus olhos ficam apertadinhos, com a voz pastosa e mais versante. 

Curiosa, não podia ver alguém conversando numa porta de casa ou numa esquina e logo bisbilhotava a conversa ou encontrava um assunto para contar. 

Numa certa ocasião estive em Corinto e não a vi pelas ruas e praças da cidade, muito menos nas igrejas ou procissões. Além de sofrer com os achaques da idade, sem família e sem ninguém, soube que ela vivia a expensas do asilo quase que como indigente. Já não sofria com as pilhérias dos meninos nem com a covardia dos adultos. Sofria, sim, com a solidão e a angústia que são os prêmios adquiridos pelos idosos neste país e neste mundo indiferente aos direitos humanos, consoantes também neste torrãozinho que é Corinto. 

Um dia, uma Maria qualquer me disse que toda Maria é sofredora, porque herdou no nome as dores de Maria Santíssima, mãe de Jesus. Não acredito nesse paralogismo, mas quero crer que, todas as Marias, não importa em que circunstâncias, não importa onde, não importa quando, estejam sob a proteção do manto sagrado da maior de todas as Marias a lhes cobrir todos os desígnios da vida. E que as preces de Maria Beú continuem a ecoar no infinito em nome de todas as Marias.  E que a sua simplicidade dê-lhe um destaque no céu, entre as outras tantas marias, pois que ela já suportou aqui na terra todo o tipo de zombarias.
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E continuamos nossa conversa sobre loucos e loucas das nossas infâncias, agora de toda Minas Gerais:

A outra tia me conta: na minha terra, Itambé, tinha um doido que quando a gente dizia OI ele respondia: OI DO CU... e a gente "rachava os bico" de tanto rir...

E a outra me conta de uma lembrança de tempos de internato em Montes Claros: fazíamos uma fila para sair da igreja, e lá estava ela na porta. As freiras recomendavam: não cumprimentem a Edith!!!Acha que obedecíamos? claro que não! já estava tudo combinado: passávamos pela Edith caladinhas, mas a última da fila ... Bom dia Edith! aí a Edith começava: BOM DIA... BOM JOUR... COMENT PASSÉ VOUS... TRES BIEN... MERCI  BEAUCOUP... TEM BOI NA LINHA TEM TEM TEM... TEM BOI NA LINHA CATARINA VAI E VEM... e Edith ficava repetindo essa fala até a tarde, quando voltávamos à igreja. Algumas de nós achava graça, outras ficavam com pena da Edith, coitada...


Pois foi com ela que me interessei por aprender francês, pois não sabia o que ela falava. Além disso, virei super fã da Edith Piaf,  e aprendi que "a vida é rosa".


Aprendi com Judith, também, um pouco sobre o Nordeste, o forró pesado;  o significado de 'boi' (marido traído, chifrudo); e 'boi na linha', que é quando alguém é intrometido, enxerido, curioso e fofoqueiro. E tem até uma música do Djavan que fala sobre 'boi na linha'! Do álbum ALUMBRAMENTO, lançado em 1980:

Não podíamos deixar de fazer uma homenagem à nossa "madrinha" do primeiro desfile do Carnaval do SBC, em 2023 nosso bloco fará 10 anos! Inspirados no nosso "patrono" Caetano": "De perto ninguém é normal, homenageamos Dona Olímpia: "catadora de reciclo nas ruas de Ouro Preto, precursora dos hippies, perambulava pelas ruas daquela cidade contando histórias do tempo do império, histórias da sua vida, da sua família, diz que ela ficou meio pancada depois de uma desilusão amorosa (o pai não a deixou se casar com o homem da sua vida, acho que porque ele não era nobre), aí ela resolveu sair de casa e mais tarde se nomeou uma espécie de recepcionista do turista que chegava a Ouro Preto, ela ficava na Praça Tiradentes recebendo as pessoas até a sua morte lá pro final da década de 70, SBCense com um pouquinho mais de história se lembra dela, os que não se lembram entrem o Google e pesquisem, é muito bacana" (nosso post de 22.outubro.2012, nos preparando para nosso primeiro desfile , que seria em 2013. 

Ela andava com um cajado e se vestia com muitas sobreposições, uma roupa por cima da outra:

E um dos comentários nesse post, uma 'quase poesia', que adoramos: "Perca a razão, perca a piada, perca até o fio da meada... Mas não perca a PIROPA!", não sabemos de quem é, está unknown... pena... e também dizia: "meu lema para 2013"... tomara que tenha sido bem sucedido(a)!

Enfim, projeto para Carnaval 2213 é misturar o TÁ CAINDO FLOR com ARTE, POESIA E LOUCURA... além de POLÍTICA e DEMOCRACIA... 

"DE POETAS E DE LOUCOS, TOMOS NÓS TEMOS UM POUCO", como dizem a Angel e a Rochelle, duas loucas SBCenses da melhor qualidade...

Até a próxima, abraços carinhosos aos loucos e loucas...






quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

O ASSUNTO DA SEMANA: um jeito SBCense de falar sobre futebol


THOR, AMOR E TROVÃO, filme de 2022, quarto filme sobre esse super herói.  As SBCenses comentam: Gatão!!!
Mas THOR é um super herói desde os anos 90 do século passado. A história é mais ou menos a seguinte, segundo pesquisa SBCense:

Thor é filho de Odin, rei de Asgard  e se prepara para ascender ao trono, mas é interrompido quando os Gigantes do Gelo tentam recuperar uma caixa fonte de poder. Ele contraria o pai e, com irmão, amiga e guerreiros, vai enfrentar os gigantes. Trava-se uma batalha. Odin, o pai, salva os Argardianos mas pune o Thor pela sua arrogância, tira-lhe todo o poder divino e bane-o para a Terra como um mortal, acompanhado de seu martelo Mjölnir, agora protegido por um encantamento para permitir que apenas os dignos possam empunhá-lo. Para não dar spoiler, Thor fica aqui na Terra como um deus nórdico dos trovões e das batalhas. Usa como arma o martelo, e tem também  o cinto  Megingjord,  que lhe dobra a força. Está associado aos trovões, relâmpagos, tempestades, árvores de carvalho, força, proteção da humanidade e também a santificação, cura e fertilidade; e também  à guerra.

Apresentamos agora outro THOR: aposentado, atua como produtor cultural, radialista e educador musical. Gosta de compor e cantar. Ama a música, a literatura e curte um dedim de prosa boa tomando um cafezim. Pesquisa sobre cultura popular, escreve crônicas e ultimamente tem se dedicado à poesia. Gosta de viajar, da simplicidade das coisas, valoriza o respeito mutuo, a renovação de conceitos e ideias e procura se antenar com o presente. 

 Thadeu Oliveira Romão... que, não sei por que razão, tirou o H do seu primeiro nome. Vai entender...

Enfim, Tadeu sem H nos manda duas crônicas sobre nosso assunto da semana. A primeira delas, a seguir: 

FUTEBOL EM CONTRIA
 Por Tadeu Oliveira Romão

Em fins da década de 1960, eu era apenas uma criança que vivia
 correndo atrás de uma bola de meia no fundo do quintal da nossa 
casa em Corinto, fruto de influência futebolística dos irmãos mais 
velhos. Meu pai, embora fosse um homem de princípios rígidos e 
não aceitasse de modo algum que os seus filhos jogassem “pelada”, 
era complacente quando se tratava das equipes de futebol da cidade.
Natural do pequenino distrito de Contria, incrustado no caminho 
entre Corinto e Pirapora, meu pai se revelava um amante do esporte 
bretão. Torcia pelo Guarany de Corinto e pelo Cruzeiro e quando 
era indagado sobre se já havia jogado futebol, ele pigarreava e 
deixava escapar um sorriso maroto dizendo que não, mas que assistiu 
lá em Contria, uma das maiores goleadas já vista na história do futebol.
Dizia ele que na época em que, com a expansão do ramal para 
Pirapora, não tardou para que o futebol chegasse ao lugarejo, talvez 
por obra dos funcionários da Central do Brasil. 
Assim, os habitantes locais começaram a praticar rachões chegando, 
inclusive, a formar um escrete local.
E para preencher o vazio e a morosidade com que o tempo passa nas 
tardes dos domingos, convidaram um time de Corinto para fazerem um 
amistoso com o escrete recém-formado. Eis que chegou o grande dia! 
Logo cedo, marcaram o campo de terra batida com cal, passaram uma 
mão de sebo nas chuteiras para amaciar e encheram a bola de couro 
G18. Ainda contaram com a cortesia do time visitante, que emprestou o 
jogo de camisas do segundo quadro para os titulares locais e arrumaram
uma pessoa que entendia das regras para ser o juiz. Meu pai fazia um 
suspense e já ia direto para o final da partida. O resultado? 42 a 0 para 
o time de Corinto.  
Se consideramos que os dois tempos equivalem a 90 minutos, dividindo 
pelo número de gols tomados, teremos que o time de Contria tomava um 
gol a cada dois minutos e oito segundos. Bastava por a bola no meio de 
campo, tirar a saída e logo logo o goleiro do time da casa corria mato 
adentro para buscar a bola, pois não havia gandula nem redes no gol. 
Papai soltava uma sonora gargalhada e dizia que o placar só não foi maior 
por causa da luta empreendida pelo goleiro com as macambiras ao buscar 
a bola no meio do mato, atrás do gol.

E a crônica nos leva às "conversas SBCenses" de sempre: 











- O primeiro comentário foi sobre Pelé: Edson Arantes do Nascimento, 
mineiro de Três Corações, atualmente com 82 anos, internado recentemente, 
estado estável porém com saúde bastante precária. Pele é considerado o 
Rei do Futebol, Atleta do Século (passado), melhor artilheiro do mundo. 
Algumas pessoas o criticam pela sua posição (ou falta de posição)
política durante o tempo em que atuou enquanto jogador. Ele não se 
posicionava em relação às questões politicas do seu tempo, ou seja, o tempo 
da ditadura militar no Brasil, não se posicionava sobre o racismo, dizem. 
No entanto, vejam a sua fala quando em 1969, se comemorou o seu milésimo 
gol, no Maracanã: 

"Pelo amor de Deus, olha o Natal das crianças, olha Natal das pessoas 
pobres, dos velhinhos cegos. Tem tantas instituições de caridade por aí. 
Pelo amor de Deus, vamos pensar nessas pessoas. Não vamos pensar só em festa. 
Ouça o que eu estou falando. É um apelo, pelo amor de Deus.
Muito obrigado".

Daí o comentário de SBCense: "Essa fala do Pelé, na época, já era considerada
comunista! Essa mania de lacração que temos atualmente, muitas vezes sem 
nem procurar entender a época, o contexto histórico, essas coisas. Vocês já 
pensaram o que se podia dizer naquela época? Já imaginaram o tanto de
gente que fugiu do Brasil por causa da ditadura, o tanto de gente  presa, morta ... "

Então pulamos para uma uma outra referência bastante interessante

:









Netflix aproveita que o futebol está em alta para lançar 
uma minissérie documental que polemiza: A “caixa preta” da FIFA 
(Federação Internacional de Futebol) será escancarada ao longo de 
uma produção com quatro episódios intitulada Esquemas da FIFA.
São abordados vários detalhes dos bastidores da associação que 
representa o futebol mundial, desde o estrelato nos campos até os 
escândalos de corrupção. Em meio a tudo isto, está em jogo um dos 
esportes mais adorados do mundo e responsável por trazer os mais 
diversos sentimentos à várias nações no mundo.

E depois dessa boa indicação, partimos para a segunda crônica do nosso SBCense Tadeu:
A PRIMEIRA CHUTEIRA

 Por Tadeu Oliveira Romão 

Geraldo Pé Roda nasceu e criou-se praticamente dentro do campo do Guarany Atlético Clube. Desde pequeno já engalobava a mãe dizendo que ia catar gravetos para acender fogo e fugia para o campo. Foi lá que ganhou o apelido. Sempre que treinava com a turma, costumava chutar a bola de bicuda e ela saia rodopiando sobre si mesma, capotando rente ao campo de terra batida. Daí, a turma começou a chamá-lo de Pé Roda. Logo, em consequência da inabilidade com a bola, fez com que assumisse titularidade do gol no segundo quadro do alvinegro corintiano. 

Naquele tempo a rigorosidade dos pais era demasiada e com dona Luíza, mãe de Geraldo, não era diferente. Família por criar, ela preferia que os filhos trabalhassem para ajudar em casa ao invés de ficar correndo atrás da bola. Além disso, os times não tinham condições de ajudar os jogadores e muitos deles tinham que comprar seu próprio material, o que ela achava um desperdício.

Geraldo Pé Roda trabalhava de servente de pedreiro e entregava todo o dinheiro para a mãe. Quando precisava das coisas ela passava a quantia necessária, mas tinha de saber “tintim por tintim” com o que gastava seu dinheiro. Certa ocasião, o sapato de Geraldo furou e ela retirou uma quantia do dinheiro guardado e mandou que ele fosse lá à loja de Jair Broto comprar um calçado. O sonho de Pé Roda adquirir a sua primeira chuteira estava prestes a se realizar, bastando dobrar a senhora sua mãe para comprar um par de chuteiras no lugar do par de sapatos. Após muita conversa ele conseguiu botar na cabeça dela que aquilo era um calçado moderno a ser usado em todas as horas, em qualquer situação, sem nenhum problema. E assim, depois de muito blábláblá Geraldo chegou em casa com o tal calçado.

Naquela época, ir à missa aos domingos era obrigação de toda família cristã e temente a Deus. Dona Luíza, católica fervorosa, convocou a família para a missa dominical e tomou o rumo da igreja matriz tendo os filhos a acompanhá-la. Geraldo, que seguia mais atrás trajando roupa de linho, paletó e chuteira nos pés, andava como se tivesse a pisar em ovos para ninguém desconfiar de nada. A dificuldade de se equilibrar no calçamento pé de moleque deixava o seu andar claudicante. Quando entrou na Matriz, que se encontrava num sagrado silêncio sepulcral, a coisa desandou. Ao pisar os azulejos arabescos da igreja, a cada passo dado com um cuidado extremo, ouvia-se um som incomum: crap, crap, crap... Os fiéis, incomodados, viraram-se a um só tempo para verificar de onde vinha aquele barulho esquisito.

À medida que Geraldo adentrava o templo religioso percebeu que aquilo escorregava como quiabo e num átimo...  buffffff!!! Escorregou e caiu estatelado no chão. Dona Luíza, vendo a cena, ficou possessa. Mas segurou a vergonha até chegar em casa para passar um corretivo no pobre e desastroso Geraldo Pé Roda. 

Bem, o mínimo que ela fez para amenizar a vergonha foi ordenar ao filho que cortasse imediatamente as travas da chuteira. E a partir daquele dia, a primeira chuteira de Geraldo Pé Roda tornou-se o seu calçado de passeio e de jogar bola. 

 _(*) Adaptação feita sobre entrevista concedida por Geraldo Fernandes (vulgo, Geraldo Perroda) a Maurílio Xavier no Jornal O Panorama, edição 56 de novembro de 2008, Corinto MG._

E terminamos nossa conversa com música mineira:

Saudade do Skank...
E do Gonzaguinha...



Obrigada querido Tadeu. Seja bem vindo ao SBC!!!
E até a próxima...
Abraços carinhosos...