segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Novas conversas sobre o Chile

 


Ainda estamos em setembro e, além de sarau sobre a primavera (vejam no Instagram @sambabobagemcerveja - aproveitem para nos seguir também por lá) , o SBC continuou conversando sobre o Chile. Logo depois do nosso post do dia 12.setembro fomos em Santa Tereza, no Instituto Helena Greco, assistir esse belo filme de Carlos Pronzato BUSCANDO A ALLENDE. 

Numa mistura de documentário com ficção, o cineasta utiliza como pretexto (ou pré-texto...) sua busca (atual) entre os chilenos da casa onde nasceu e morava Salvador Allende para exibir entrevistas e depoimentos de pessoas da época - entre os anos 1970, ano em que ele o mesmo foi eleito presidente do Chile, até 73, quando ocorreu o golpe - numa tentativa de compreensão histórica desses acontecimentos. 

Pois - refletimos - a história serve para compreendermos o presente e projetarmos o futuro, além de nos colocar como sujeitos na construção da história prospectiva. Por isso nos servimos desde filme para continuar nossas conversas, assistir outros filmes, e trazer para a atualidade a compreensão da América Latina e do Brasil. Vejam que o debate pós filme contou com a participação de um brasileiro exilado no Chile que vivenciou o golpe em 73, Marco Antonio Meyer, que nos fala, emocionado, sobre essa época, sobre outros intelectuais, artistas e políticos que se exilaram no Chile em função do golpe no Brasil, principalmente com o AI5 em  1968... e, posteriormente ao golpe militar no Chile, todas essas pessoas tiveram que se exilar, de novo, em outros países, principalmente na Europa.

Depois da fala emocionada do Marco Antonio, o professor, fotógrafo e documentarista Richardson Pontone nos brindou com uma perspectiva crítica|histórica do capitalismo, do imperialismo estadunidense pós 1945... então, os interesses econômicos estão por trás das ideologias "moralistas"... qual era a principal riqueza do Chile? o cobre! e os EUA estavam de olho no cobre para alimentar a indústria armamentista, naquela época a guerra era com o Vietnã, O Vietnã do Norte contra o Vietnã do Sul, EUA apoiando este último "contra o comunismo"... Ho chi Ming, grande líder do Vietnã do Norte, dizem que venceu a guerra da prisão, escrevendo poemas aos seus comandados. Em 1975 os Vietnames se unificaram, os EUA já haviam, derrotados, abandonado aquele país. Tragédias provocadas pelas guerras, milhões de pessoas mortas... para alimentar a indústria armamentista, para alimentar o poder, para alimentar o imperialismo... a lógica do capitalismo é cruel.


Voltando ao Chile, recebemos a indicação de documentário que está no Youtube no site da UJC: considerado um dos melhores e mais completos documentários latino-americanos, A BATALHA DO CHILE, do cineasta Patricio Guzmán. Dividido em três partes: A insurreição da burguesia, O Golpe Militar e O Poder Popular. E uma edição especial neste site se completa com outros dois documentários: Patrício Guzmán, uma história Chilena, sobre a trajetória única deste cineasta; e A resistência final de Salvador Allende, uma reconstituição dos últimos momentos de Allende antes do golpe.

"Salvador Allende põe em marcha um programa de profundas transformações sociais e políticas. Desde o primeiro dia a direita organiza contra ele uma série de greves, enquanto a Casa Branca o asfixia economicamente. Apesar do boicote, em março de 1973 os partidos que apoiam Allende obtém mais de 40% dos votos. A direita compreende que os mecanismos legais já não servem. De agora em diante sua estratégia será o golpe de estado. A Batalha do Chile é um documento que mostra, passo a passo, esses acontecimentos que comoveram o mundo". 

O SBC agradece a indicação e super recomenda: Entrem no site UJC Brasil no Youtube, se inscrevam no canal e vejam os documentários. Vale a pena! Nossa proposta é conhecer mais o Chile, conhecer mais a América Latina... "lido e corrido" e através dos filmes... conhecer a história dos países da América Latina... e fazer o exercício de comparação com o Brasil. A comparação pressupõe ver semelhanças e diferenças. E estaremos nos conhecendo através da comparação. Estaremos, também, desenvolvendo nossa competência para a crítica e, prospectivamente, construirmos nossa identidade autônoma, o trabalho de construir a resposta a "quem somos nós". 

Saindo dos documentários, vimos também outros dois filmes do mesmo cineasta chileno, Pablo Larraín, que valem a pena:

Em 2012 Larraín fez o interessantíssimo “No” para reconstituir realisticamente o processo do plebiscito de 1988 que tirou os militares do poder no Chile. 

Pressionado pela comunidade internacional, o ditador Augusto Pinochet aceita realizar um plebiscito nacional para definir sua continuidade ou não no poder. Acreditando que esta seja uma oportunidade única de pôr fim à ditadura, os líderes do governo resolvem contratar René Saavedra (Gael García Bernal) para coordenar a campanha contra a manutenção de Pinochet. Com poucos recursos e sob a constante observação dos agentes do governo, Saavedra consegue criar uma campanha consistente que ajuda o país a se ver livre da opressão governamental.


Agora, em 2013, o mesmo diretor recorreu à fantasia mais anárquica possível para tratar da pós-ditadura chilena. É uma filmagem para remexer o entulho histórico, social e econômico deixado pelos militares no país, segundo Enio Vieira, na Revista Bula.

Larraín surpreende ao criar uma sátira política e "surreal" sobre Pinochet, por meios das figuras do vampirismo. O filme faz uma mistura de ficção, documentário, jornalismo, teatro jurídico de julgamentos e, acima de tudo, narrativas de fantasia, monstros, terror. O personagem Augusto Pinochet  já foi dado como morto na história, mas aparece vivíssimo na pele de um vampiro francês de 250 anos de idade. Vive isolado com a esposa e um mordomo. Porém, seus cinco filhos querem sua morte definitiva para receber a herança, fruto da pilhagem feita pelo general quando presidente do Chile. O filme resgata uma série de histórias verídicas sobre as famosas contas bancárias mantidas pela família Pinochet, em paraísos fiscais, e alimentadas por simples corrupção. Num dos trechos mais engraçados, o protagonista discute com a interlocutora se é mais adequado ser chamado de assassino ou de ladrão. Ele prefere ser lembrado como assassino.

A sequência mais anárquica de “O Conde” é a revelação de quem é a narradora do filme. Na verdade, o grande vampiro é o neoliberalismo implantado ao mesmo tempo no Chile e na Inglaterra. Pela visão correta do diretor, o DNA é o mesmo. O sangue bebido é o de comunistas, sindicalistas, opositores. "É uma alegoria do morto-vivo dos vampiros que ilustra a literatura há séculos e ainda é uma imagem representativa para ver a realidade", diz o crítico Enio Vieira.

E para terminar nossa conversa com arte - e com esperançar - lembramos Neruda:


Uma primavera cheia de arte, cultura, e boas conversas para todas as pessoas, é o que deseja o Coletivo SBC.


Até a nossa próxima conversa, talvez sobre a América Latina, talvez sobre a Argentina... quem sabe... abraços carinhosos













domingo, 24 de setembro de 2023

Sobre perdas... e sobre vida


 É com grande alegria que resgatamos nosso projeto ARTE NA PANDEMIA... ou melhor, repaginamos... agora podemos dizer de ARTE PÓS PANDEMIA... ou ARTE E VIDA...

Lembrando Freud, numa livre interpretação: dizia ele no seu livro "O mal estar na civilização" que aprendemos, a maioria de nós, a ter como objetivo de vida a evitação do sofrimento... poucas pessoas aprendem a orientar a vida para a busca do prazer. Porém, são pelos mesmos poros no nosso corpo que entram tanto a dor quanto o prazer... e, na evitação da dor, fechamos os poros... e a triste consequência, desaprendemos a sentir alegria de vida. Quando abrimos os poros por eles entram a tristeza e a alegria, entre outras emoções... entram e saem... e conseguimos nos voltar para a nossa orientação de vida, a busca do prazer, a alegria de vida. 

Trata-se de uma aprendizagem difícil, principalmente numa sociedade em que o individualismo, a competitividade, a busca do sucesso se sobrepõem à empatia, à solidariedade, à busca do coletivo. Mas arregacemos as mangas! e busquemos este mundo mais bonito, tanto no plano do coletivo quanto nas nossas subjetividades... 

É com esse espírito que compartilhamos o texto a seguir, da nossa querida SBCense Zeza... Maria José, que transforma em arte sua vivência de perda... e se volta para a vida. 

Obrigada Zeza...

O FLORESCER DAS ORQUÍDEAS

Acordo. Começo a fazer o meu café. Olho pela janela, o lá fora não é capaz de diminuir a

melancolia e a nostalgia de dentro. Como em todas as manhãs, observo a minha orquídea que,

há dias, aguardo o abrir dos seus botões. Está sobre um armário branco a me esperar e eu a

esperar sua floração, num tempo que lhe é necessário, nem mais nem menos, por mais que

meu olhar urgente deseje a beleza e o seu frescor a enfeitar meus sentidos.

Agora são duas: uma branca que me acompanha há alguns anos e a cada floração parece não

se importar com meu anseio e impaciência.

A outra me faz companhia há pouco tempo. Trouxe-a da casa de minha mãe após a sua morte,

como um amuleto, um carinho, uma lembrança, a me fazer companhia na saudade.

Minha mãe gostava muito de plantas e de plantar, ela caminhava para sua despedida e sua

orquídea renascia. O renascer e o morrer. Não consigo lembrar-me da cor dessa orquídea, mas

sei que vai trazer um colorido para minhas manhãs mais sombrias.

Pus-me a observá-las, isso me trouxe um conforto, como se me acariciassem e fizessem com

que meu luto se tornasse mais leve. Parecem ensinar-me que eu dê tempo ao tempo para que

as lembranças se tornem apenas lembranças, saudade apenas saudade, sem dor, sem

arrependimentos: por palavras que não foram ditas, afagos que não foram feitos, e assim vou

curando-me no tempo a observar o crescimento de minhas orquídeas e o arrefecimento de

minha dor.

Ainda não havia reparado nesse poder curativo das orquídeas: o da paciência, o do abraço

diário, o do lamento escutado, o do renascer da florada, o do tempo impossível de acelerar, o

de me fazer sentir viva frente a esses sentimentos de tristeza e melancolia que com certeza

passarão, e poder agradecer a vida vívida e vivida a cada dia.

Maria José Birro Costa

27/07/2023


Obrigada mais uma vez querida Zeza!

E o convite para ARTE PÓS PANDEMIA... ou ARTE E VIDA... continua... mandem seus textos poemas, músicas, fotos, pinturas... toda arte que "não serve pra nada", senão para a vida...

Abraços carinhosos,

SantuzaTU



terça-feira, 12 de setembro de 2023

Conversas SBCenses: sobre o CHILE

Praticamente uma continuidade do assunto SBCense da semana passada no nosso Sarau : A DOMINAÇÃO CULTURAL, onde conversamos sobre nossas cabeças (e nossas "almas") dominadas, antes pelo eurocentrismo depois pelo imperialismo estadunidense... o assunto da semana no SBC é o Chile.

Pois no dia 11 de setembro se completou 50 anos do golpe militar no Chile:  

Nesse dia, em 1973, as forças armadas do Chile bombardearam o Palácio de la Moneda, sede do governo, para depor o socialista Salvador Allende da presidência conquistada nas urnas três anos antes, em 1970. O golpe militar se concretizou com o "suicídio" de Allende.

O general Augusto Pinochet tomou o poder e instalou um regime militar que executou 3.200 pessoas em 17 anos. Nessa época, o Brasil já vivia, há nove anos,  a "nossa" ditadura militar. 

Começava naquele país  uma ditadura que perdurou até 1990 e teve Augusto Pinochet como principal carniceiro. Foram anos de perseguições a grupos políticos, desaparecimentos de mulheres, homens e crianças e milhares de assassinatos  promovidos pelo Estado tomado pelos milicos. Sadismo fazia parte do pacote. 


O músico Victor Jara, em setembro de 1973, por exemplo, tornou-se símbolo da barbaridade dos fardados após ter as mãos trucidadas antes de ser assassinado. Era popular pelo talento com o violão, que embalava canções de protesto. Lembramos, na nossa conversa, de documentário na NETFLIX: ReMastered: Massacre no Estádio, dirigida por Bent-Jorgen Perlmutt.

Como em outras ditaduras do continente, nem bebês, meninas ou garotos foram poupados pelos militares. Em "Crianças", livro lindo e emocionante, María José Ferrada e María Elena Valdez criam poemas ilustrados para 34 pequenos desaparecidos ou executados pelos oficiais chilenos. Neste livro se eternizam gente como Luz Marina Paineman Puel, morta com 1 mês de vida, e Lorena del Pilar Escobar Lagos, assassinada aos 3 anos. Saiu pela Pallas Mini com tradução de Carla Branco.

Acima outro livro imperdível citado na nossa conversa, escrito por Francisco Ortega e ilustrado por Félix Vega, com tradução de Delfim Studio DelRey.

Uma sinopse do livro: "A morte de Augusto José Ramón Pinochet Ugarte em 2006 trouxe, tanto para o povo chileno como para personalidades internacionais, um senso de incompletude. O escritor uruguaio Mario Benedetti procurou sintetizar este sentimento, à época: “É a morte de um ditador que foi muito cruel com uma parte de seu povo. Neste caso, a morte venceu a justiça”. Em Os Fantasmas de Pinochet, Félix Vega e Francisco Ortega buscam, na ficção, um modo de redimir esta injustiça histórica, ao criarem, no campo do além, o julgamento definitivo do ditador do Chile nos anos 1970 e 80. Para isso, eles se valeram de uma extensa bibliografia, entrevistaram diversas pessoas, inclusive nomes ligados ao militar, e pesquisaram veículos de imprensa para recriar cenas cruciais na vida de Pinochet, bem como o seu juízo final. São apresentadas evidências, provas e testemunhos que nos guiam, não apenas a um veredito, mas também ao destino de uma nação".

Nossa historiadora  SBCense , além de citar o livro de Frida Modak,  fez um resumo dos fatos:

“Salvador Allende liderou o projeto que buscava estabelecer o socialismo por meios democráticos. Seu programa de governo contemplava a construção de um Estado popular e de uma economia planificada de estilo estatal”, afirma o centro de recursos digitais Memoria Chilena, do Governo do Chile. 

O Governo de Salvador Allende, eleito democraticamente em setembro de 1970, realizou nacionalizações generalizadas e reformas consideradas radicais que não agradaram a elite chilena e observadores internacionais, especialmente às empresas transnacionais. 

Allende era médico pela Universidade do Chile, maçom e político socialista e marxista. Quando, em outubro de 1970, o Congresso ratificou sua vitória democrática um mês antes, ele se tornou o primeiro político com esse perfil a chegar ao poder por meios populares, segundo a Memória Chilena.


"No entanto, a radicalidade do programa governamental despertou oposição frontal, tanto dentro do país como internacionalmente. Em meio a um contexto em que ainda prevalecia a política da Guerra Fria, o governo norte-americano decidiu usar todas as armas necessárias com o objetivo final de derrubar o governo chileno”, explica Memoria Chilena, ao se referir ao apoio oculto que o governo de Richard Nixon deu ao golpe militar.

Em 1972, a instabilidade política era mais notável, com falta de bens de primeira necessidade nas ruas e rumores crescentes de um golpe militar.

Em 29 de junho de 1973, ocorreu uma tentativa de golpe de Estado no Chile, conhecido como “tanquetazo”. Ironicamente, o general Augusto Pinochet ajudou a reprimir essa tentativa de golpe militar, segundo a Memória Chilena.

Na época, Pinochet ocupava o cargo de comandante-chefe interino do Exército. Quase dois meses depois do “tanquetazo”, em 23 de agosto de 1973, ele foi promovido ao cargo de comandante-chefe por recomendação que ele mesmo fez ao presidente Allende. Apenas 19 dias após a sua promoção ao cargo de comandante-chefe, Pinochet liderou o golpe de Estado de 11 de setembro de 1973.

“Por volta das 11h da manhã, o presidente Salvador Allende dirigiu a sua última mensagem ao país, por meio de uma rede de rádios simpáticas ao governo, declarando sua posição de ‘continuar defendendo o Chile'”, detalha a Memória Chilena.

Ao meio-dia, aviões Hawker Hunter da Força Aérea Chilena iniciaram o bombardeio ao Palácio Presidencial, em um ataque aéreo que durou cerca de 15 minutos. Pouco depois, em questão de minutos, o La Moneda foi destruído, e Allende foi encontrado morto em seu interior junto com a arma com a qual se suicidou.

Depois, uma Junta Militar presidida por Pinochet assumiu o controle do Governo. A ditadura duraria até 1990, quando, em 11 de março, Patricio Aylwin recebeu a faixa presidencial de Pinochet, após vencer as primeiras eleições democráticas do país desde a vitória de Allende em 1970.


Voltando às referências artísticas sobre o evento, lembramos de dois filmes sobre Pablo Neruda, poeta Chileno, senador pelo Partido Comunista do Chile. O primeiro filme, NERUDA, está na NETFLIX, o segundo, O CARTEIRO E O POETA, está no youtube. 

Querida SBCense fez um resumo sobre Pablo Neruda: "Quando o Presidente do Chile, em 1948, baniu o comunismo do país, foi emitido um mandado de captura para Neruda. Amigos esconderam-no durante meses no porão de uma casa na cidade portuária de Valparaíso; Neruda escapou por uma passagem de montanha perto do lago Maihue para a  Argentina. Anos mais tarde, Neruda foi um conselheiro próximo do presidente socialista do Chile Salvador Allende. Quando Neruda regressou ao Chile após o seu discurso de aceitação do Prémio Nobel, Allende convidou-o a ler no Estádio Nacional perante 70 000 pessoas. Neruda foi hospitalizado com cancro em setembro de 1973, na altura do golpe de Estado liderado por Pinochet que derrubou o governo de Allende, mas regressou a casa após alguns dias quando suspeitou que um médico o injetara com uma substância desconhecida com o objetivo de o assassinar por ordem de Pinochet. Neruda morreu na sua casa em Isla Negra a 23 de setembro de 1973".

Por razões políticas o poeta Pablo Neruda se exila em uma ilha na Itália. Lá um desempregado, quase analfabeto é contratado como carteiro extra, encarregado de cuidar da correspondência do poeta, e gradativamente entre os dois se forma uma sólida amizade.

O Carteiro e o Poeta é um comovente filme italiano de 1994, ganhador do Oscar de melhor trilha sonora (Luis Bacalov). Inspirado com maestria no romance do chileno Antonio Skarmeta, o filme é uma verdadeira obra-prima. Um simples carteiro Mario (Massimo Trisi) em uma ilha no litoral da Itália (Capri) entrega as correspondências do poeta Pablo Neruda ( Philippe Noiret) onde se exilou. Desse encontro nasce uma grande amizade, aos poucos as barreiras entre esses dois homens aparentemente opostos vão se quebrando. Mário, em sua simplicidade, ganha o carinho de Neruda, que o ajuda a vencer a timidez para se aproximar de sua amada Beatrice (Maria Grazia Cucinotta). A trilha sonora casa perfeitamente com a belíssima fotografia e o roteiro impecável. O grande ator Massimo Troisi faz aqui seu último trabalho, falecendo no último dia da filmagem...
Essas referências históricas e artísticas (filmes, músicas, ...) ativaram nossas memórias, assim como nossa perplexidade sobre o momento atual que estamos vivendo no nosso país.  Semelhanças -  e  perguntas - são inevitáveis:
. primeiro, onde e como você estava em 1973?  algumas e alguns SBCenses nem tinham nascido, outras pessoas que viveram essa época  deram seus depoimentos: 
- "Eu era estudante, fazia curso superior nessa época. No Brasil dos anos 70 vivíamos a época mais repressora do nosso regime militar que ocorreu com o golpe de 64. Tínhamos medo de conversar sobre política, mais de três pessoas juntas já era considerado "complô contra o Estado", em quase toda sala de aula da nossa faculdade, não sei muito bem como isso acontecia, mas o fato é que "elegíamos" um aluno ou aluna, colega nossa,  que seria "informante", e essa pessoa era "isolada" da turma... não sabemos até hoje sobre a veracidade desse dado, parece que era uma paranoia consequência do medo. No entanto, fazíamos politica, num sentido amplo, conversávamos sobre contracultura, sobre feminismos, sobre o mundo..."
. E, nesse contexto, conversávamos sobre a União Soviética, a China, sobre Cuba, países que implantaram o socialismo pela revolução... e a experiência chilena era inédita: o socialismo implantado pela via democrática, como disse nossa historiadora. 
. Conversávamos, também sobre a "democracia" (palavra tão distorcida, mal usada, precisamos resignificar a democracia...) nos EUA, sobre a guerra do Vietnan, sobre o movimento hippie e a contestação ao consumismo, o pacifismo, o respeito à natureza e o "amor livre". Isso tudo com poesia, como a poesia do Ho chi Minh, revolucionário, político, escritor, poeta e jornalista vietnamita.
. Sabemos que a história não é linear. Então, trouxemos essa história para a atualidade. Olha só:  no Chile o Allende não teve o apoio do Congresso que, em sua maioria, era composto, ou melhor, eleito, pelo que podemos chamar de "Direita" e de "Centro". Também temos uma história que conta que, em visita ao Chile, Fidel Castro pergunta a Salvador Allende se ele confiava no seu exército, ao que ele responde que sim! E vejam no que deu... Ai, isso nos traz medo e perplexidade...
. E como estão as coisas aqui no Brasil? Para os que viveram os anos 60 e os que conhecem a história (tão necessário esse conhecimento...), tivemos um golpe militar em 64, que contou com a participação dos EUA, em razão de um governo progressista, que falava (desde então!) sobre reforma agrária! Fora esse curto governo progressista, tivemos dois governos Lula e mais um e meio governo Dilma, ou seja, cerca de 14 anos de um governo que nem fala em socialismo, apenas num Estado que possa acabar com a fome e oferecer educação, saúde e trabalho para o povo. 
. E, agora, estamos de novo com o governo Lula... num mundo que começa a superar a unipolaridade (que, na segunda metade do século passado, pós segunda guerra, foi se transferindo da Europa para os Estados Unidos) ... e construir uma visão multipolar, num mundo em que se pode falar sobre identidade e soberania.  
. Ora, se governar vem a ser "a arte de mediar conflitos", qual seria o limite disso? como saber o ponto certo entre a "submissão" e o momento certo da "ruptura"?  
. Decerto essa sabedoria só vem com o fazer que se combina com o conhecer e refletir ... agora no dia 11 estávamos representados no Chile, por ocasião das cerimônias que lembravam os 50 anos dessa tragédia (lembrar para não esquecer e não repetir...)  por dois ministros (além de embaixadores): 
Silvio Luiz de Almeida, filósofo e professor universitário, atual ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, que disse:
e Flávio Dino de Castro e Costa, advogado, político, professor e ex-magistrado brasileiro, filiado ao Partido Socialista Brasileiro, atual ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil.  Flávio Dino, começando com a lembrança de que a esperança, a justiça e a luta são femininas, fala da memória como algo vivo, em movimento  - olhar para trás e para frente - e homenageia heróis chilenos e brasileiros do tempo da ditadura nos dois países. Homenageou, ainda,  artistas como o cineasta Silvio Tendler, cineasta e historiador brasileiro, conhecido como "o cineasta dos vencidos" ou "o cineasta dos sonhos interrompidos" e o fotógrafo Evandro Teixeira, agora com 87 anos,  que reencontrou, 50 anos depois, com Vladimir Salamanca, agora com  65 anos.  Evandro, em 73, cobrindo as consequências do golpe militar no Chile, deu de cara, por detrás das grades do Estádio Nacional, em Santiago, com Salamanca, então com 15 anos. Eles se reencontraram agora, na capital do Chile na abertura da exposição de Teixeira no Museu da Memória, evento que integra os atos que recordam os 50 anos do golpe militar que levou Augusto Pinochet ao poder. 
Dino lembrou também de Gramsci, filósofo marxista italiano, que usa o termo interregno para se referir a um período de transição histórica em que o "velho não morreu e o novo ainda não nasceu" e em que aparecem as "anomalias"... isso para nos dizer da coragem de "olhar nos olhos do fascismo" e "pegar o fascismo pelas orelhas", esse fascismo violento, que nega as diferenças, mais do que isso, busca eliminá-las. 
Sobre a exposição de Evandro Teixeira Dino comentou:  
“Essa exposição do Evandro é muito importante pelas fotos, pela vida que delas emerge, é importante, sobretudo pela emulação de valores e princípios sem os quais não se constrói a luta coletiva, as imagens de Evandro Teixeira são vivas e são fotos de heróis. Porque a história se constrói pela luta de milhões, mas os heróis são imprescindíveis. Por isso, o exercício da memória é o exercício da democracia, é o exercício da coerência na luta democrática e popular e contra o fascismo”

Ainda no Chile, Flávio Dino afirmou que Brasil terá Museu de Memória e Direitos Humanos: "Devemos ao Brasil e vamos pagar essa dívida com a criação, no Brasil, de um Museu da Memória e dos Direitos Humanos", disse o ministro da Justiça.

E não é mesmo o que nós, brasileiras e brasileiros, mais precisamos!!! 
MEMÓRIA! ... E NOVAS HISTÓRIAS SOBRE O BRASIL VERDADEIRO!!!
Para o movimento de sair da DOMINAÇÃO CULTURAL, e construir nossa IDENTIDADE - Quem somos nós...


Abraços carinhosos a todas as pessoas SBCenses, que gostam e valorizam as boas conversas...






sábado, 9 de setembro de 2023

Sarau 7 de setembro: Independência? A dominação cultural

 No Espaço Cultural COMUNA o SBC realizou, no dia 7 de setembro, um belo encontro de amig@s, que é a melhor coisa que sabemos fazer: o nosso SARAU de 7 de setembro... permeado de história (e histórias), reflexões, depoimentos pessoais, poesia, música e boas conversas. Tudo isso com cerva do SARUÊ, drinks do Andarilho e comidinhas das queridas do Congo... e tudo isso no espaço aberto da Comuna Cultural!

Este foi nosso cenário. E o que sobrou de boas trocas faltou de fotos e vídeos, poucas pessoas registraram o evento. Dizem que quando está muito bom a gente se esquece de alguma coisa, como por exemplo pedir para fazer vídeos e fotos. Foi o caso. Mas um resumo do conteúdo... temos... a seguir:



O 7 de setembro pode ser comemorado como uma data de liberdade? essa foi nossa pergunta...

e pesquisamos pra levar o tema pro nosso sarau ... e concluímos:

a independência do Brasil foi um ato conservador, que manteve a escravidão, os interesses da oligarquia, dos proprietários de terras... e a dominação dos ingleses!

A história ...que não conhecemos... é a de que dom Pedro I entrou em conluio com o latifundiário brasileiro, proprietários de escravos, e na medida que ficou claro que as cortes e a sociedade em Portugal queriam reconquistar o lugar proeminente da Inglaterra em relação ao Brasil, resolveram separar os dois países. 

Portanto, Dom Pedro se aliou aos proprietários de terras e escravocratas para manter o poder. E por isso, fomos o último país a abolir a escravidão, e sem dar nenhum direito a esse povo!

Argentina, Venezuela, Chile, Peru e Equador tiveram que organizar exércitos populares para combater os espanhóis e adotaram a bandeira republicana. O brasil foi o único país a declarar independência e manter o imperador!

Esses dados nos causam perplexidade...

Aqui a nossa querida SBCense Neide entrou com a história da Leopoldina... e com seu depoimento pessoal:

"História de Leopoldina... Por coincidência nasci em Leopoldina, cidade da Zona da Mata que passou a ser Vila em 27 de abril de 1854 e foi elevada a cidade em 1861. Em 2022 uma escultura em homenagem à princesa substituiu o símbolo do Rotary.

E a partir do que foi relatado pela Santuza podemos perceber que nosso príncipe era sapo.

E como em toda nossa história, as mulheres que participaram desse processo permaneceram na invisibilidade e não estiveram presentes em nossos livros de história.

E continuando a tirar o véu de tudo o que foi escondido de nós  chegaremos a uma princesa. Só fora dos livros escolares nós podemos conhecer e reconhecer o papel da princesa Leopoldina na nossa independência.

Princesinha dos nossos contos de fada? Querendo ser acordada? Não.

Mas, há controvérsias!!!! Para o historiador e escritor Paulo Rezzutti, Leopoldina foi de grande importância na independência. Ela influenciou D. Pedro no dia do Fico (janeiro de 1822) . No papel de regente durante a viagem de D. Pedro a São Paulo, presidiu uma reunião do Conselho de Estado que teve como fruto a recomendação da declaração da independência do Brasil. Portanto ela foi a primeira mulher a governar o país.

Nasceu em Viena, Austria, em 22 de janeiro de 1817.Aos 20 anos se casou sem conhecer Dom Pedro. Viajou durante 6 meses para chegar ao Brasil e trouxe na tripulação pintores, cientistas e botânicos.

Da família poderosa, os Habsburgo foi preparada para governar. Falava 11 idiomas e teve aulas de teatro para aprender a desempenhar o papel de monarca.

Para Rezzutti ( D. Leopoldina: a história não contada- A Mulher que Arquitetou a Independência do Brasil) ela era revolucionária por ter sido a primeira mulher na altas esferas políticas do Brasil. Relacionava-se bem com os pobres, era contra a escravidão. Acreditava que tinha uma função pública.

Já Maria Celi Chaves Vasconcelos, professora da Educação da UERJ, acredita que ela apenas desempenhou o papel para o qual foi educada e tinha medo de que acontecesse com ela o mesmo que com Maria Antonieta, sua avó. Para ela, Leopoldina era submissa e aceitava ordens e traições do imperador. Sua irmã mais velha, Maria Luiza, era casada com Napoleão, inimigo da família. Leopoldina a considerava como modelo e de maior importância por ter se casado com Napoleão. 

Na verdade Leopoldina teve um  papel ativo no Brasil. Morreu em 11 de dezembro de 1826, aos 29 anos.

E, na verdade, também, ao contrário do que nos foi ensinado, as cores da bandeira se referem as duas casas que deram origem ao Brasil independente: A Casa Bragança (verde) e a Casa Habsburgo (amarela)".

Então, Neide  nos convocou:

Deixemos a realeza e voltemos para o povo, grande protagonista da nossa história!

Cantemos Liberdade liberdade, abre as asas sobre nós...  da Imperatriz Leopoldinense,  em 1989:

O refrão é excepcional... mas prestem atenção à letra, ela exalta a Princesa Isabel... Isso é pertinente  ao nosso assunto "dominação cultural" e construção da nossa "Identidade Autônoma": A "canetada" da Princesa Isabel invisibilizou  toda a luta e conquistas, que já aconteciam,  das pessoas escravizadas,  pela sua libertação!

Em seguida outra grande SBCense, nossa querida Antonieta, professora de história |(aprendemos muito com ela|), vestida de verde e amarelo,  nos conta duas histórias preciosas: uma outra independência do Brasil, na Bahia; e a história da Maria Quitéria... mulheres invisibilizadas na nossa história...temos inúmeras delas! 

"Temos, também tão pouco conhecida, uma outra história da independência do Brasil, especificamente na Bahia, 2 meses antes do grito do Ipiranga.

"Os dois exércitos se encontraram em 8 de novembro em Pirajá, na periferia de Salvador." Durante 10 horas, cerca de 10 mil soldados combateram com ferocidade. Esse combate consagrou uma heroína e deu  origem a um mito. 

A primeira é Maria Quitéria de Jesus, então com 30 anos, primeira mulher nas forças armadas brasileiras.

O desfile realizado no dia 2 de julho tem percurso entre a Lapinha e o Campo Grande, e conta com a presença do Caboclo e da Cabocla, símbolos da guerra pela independência baiana e da cultura local. Caboclo e Cabocla, de certa maneira, são nossos ancestrais, mestiço do povo primitivo com o colonizador português, e tb com o africano.

Mulher feita, legalmente emancipada, sabendo bem o que quer, Maria Quitéria consome-se de amor pela Pátria prestes a nascer. Assumindo a sua condição feminina, livra-se, por fim, dos constrangimentos da simulação. É, doravante, o soldado Medeiros, nome com que se apresentara à tropa. Os milicianos, a princípio ousados, aprendem a respeitá-la. Por baixo, aquele soldado de voz macia veste saias, mas é homem, na coragem, no trato, no companheirismo. 

Quitéria torna-se exemplo e, mais que isso, mascote da tropa interiorana de resistência".


Então percebemos... e compartilhamos com o nosso público, a importância do movimento de percepção... do PARTICULAR (nossas subjetividades) para o GERAL (nossa compreensão de mundo) ...  e volta ao PARTICULAR para nos compreender melhor... e vai, de novo para o GERAL, a visão de mundo... e, assim, ampliamos nossa consciência... este  movimento fizemos no SARAU...

Compartilhamos um livro sobre nossos povos ancestrais,  gentilmente oferecido pelo SINPRO, Sindicado dos Professores de Minas Gerais:


Este livro fala, no capitulo 7, sobre três filósofos indígenas: Daniel Munduruku, David Kopenawa Yanomami e Ailton Krenak. 



Tivemos, também, a leitura de uma parte, a sexta e última parte, do poema de Castro Alves:

Auriverde pendão de minha terra,

Que a brisa do Brasil beija e balança,

Estandarte que a luz do sol encerra

E as promessas divinas da esperança...

Tu que, da liberdade após a guerra,

Foste hasteado dos heróis na lança

Antes te houvessem roto na batalha,

Que servires a um povo de mortalha!...

"O Navio Negreiro" é um poema de Castro Alves, um dos mais conhecidos da literatura brasileira. Foi escrito em 1870, quando o poeta tinha 24 anos, e denuncia a situação dos africanos arrancados de suas terras e tratados como animais nos navios negreiros que os traziam para ser propriedade de senhores e trabalhar sob as ordens dos feitores. A obra é abolicionista e retrata o negro como um herói, quebrando os laços com o ultrarromantismo. "O Navio Negreiro" é uma parte do poema épico "Os Escravos" e é dividido em seis partes com metrificação variada. A linguagem do poema emite pessimismo e angústia".

Foi emocionante, ou melhor, a emoção INDIGNAÇÃO foi suscitada. E o interesse em conhecer mais a nossa história... e nos posicionarmos ... e,  tomando consciência da DOMINAÇÃO CULTURAL que vivemos, nos instrumentarmos para o movimento de construção da nossa IDENTIDADE AUTÔNOMA. E a arte, a música, a poesia, nos serve de ferramenta para este movimento.

Outras poesias foram faladas, músicas... Gonzaguinha, Fernando Pessoa, Drummond, poemas autorais, Joyce ("o que é ser feminina..."). Obrigada a todas as pessoas que participaram, presencialmente e a distância, com ótimos "pitacos"... Livros, como por exemplo, "As veias abertas da América Latina", de Eduardo Galeano; filmes, como "Macunaíma, o herói sem nenhum caráter", com Grande Otelo, baseado no livro de Mário de Andrade de 1928 (o Movimento Modernista, dessa época, era também a tentativa de se construir uma identidade brasileira através da arte, no nosso entendimento). E, mais recente, os filmes "Bacurau" e "Medida Provisória". Músicas de Emicida... poemas de Neggo Tom, Eliza Lucinda, entre outras e outros.


Enfim, é muita coisa que precisamos conversar, lembrar, cantar, dizer... para que se ative a nossa perplexidade, que consideramos o princípio do raciocínio orientador para uma nova visão de mundo e de nós mesm@s... e a construção da nossa identidade. Parece que precisamos fazer outro sarau sobre isso, ou tema semelhante... nos enviem sugestões...

E terminamos com uma música de "ESPERANÇAMENTO": "Pra não dizer que não falei  das flores", música de Geraldo Vandré, segundo lugar no Terceiro Festival Internacional da Canção em 1968.


E, ainda, fizemos um exercício de reflexão que nos mostra como ocorre a dissociação entre a vida da pessoa e a percepção de mundo... 

Ou seja, faz parte da "dominação cultural" a construção de uma visão alienada de que NÃO somos construtores do mundo, da história, uma visão, no nível subjetivo,  "egoísta", individualista, dissociada da construção coletiva.

A visão "você vai estar bem se o mundo estiver bem" não existe na "dominação cultural". Existe, sim, a ideia "eu vou estar bem, o mundo que se foda". 

Enquanto... um conceito simples: "comunista", significa "busca do bem comum"...

Grande jurista e filósofo (e grande SBCense) Allyson Mascaro fala em "afetos sociais": alegria de compartilhar, de estar em conjunto "versus" esse nosso sistema, que alimenta o individualismo, o consumismo, a competitividade, a meritocracia...

O SBC é grato a todas as pessoas que nos abraçam, que estão juntas nos nossos projetos, participam e se envolvem... e nós falamos sempre: 

OS BONS ENCONTROS SÃO SEMPRE EM MÃO DUPLA, uma "filosofia de vida" SBCense, um conceito de "bem-viver".

Até nosso próximo encontro... primeira quinta feira do mês de outubro...

Abraços carinhosos a todas as pessoas








sábado, 2 de setembro de 2023

Retomando projeto GALERIA DE SBCenses FAMOSAS...

Na postagem de 10.dezembro de 2012, com o título IDEIAS SBCenses, iniciamos o projeto GALERIA DE SBCenses FAMOSAS. No caso, FAMOSAS combina com "pessoas"...  dos vários gêneros...

Foi uma ótima brincadeira, convidávamos as pessoas SBCenses a nos encaminharem relatos de pessoas admiradas, uma breve história da pessoa e as características que a faziam entrar para a nossa GALERIA, ou seja, pessoas que, de alguma forma, servem de "modelo" SBCense de uma vida bem vivida, com riso, valorizando as amizades e o sentido estético para além do sentido moral, como "reza" nossos "princípios" ... e, além disso, pessoas que pensam - e agem - em função da construção de relações mais simétricas e de um  mundo mais digno, mais bonito, mais justo,  mais equânime, ou, como diz nosso slogan: AMOR E POLÍTICA, NA CAMA E NO MUNDO. 

É como um "exercício de admiração"... e nossa primeira pessoa para a galeria foi Dona Olympia, moradora de Ouro Preto lá pela década de 80 do século passado, que virou nossa madrinha no primeiro desfile de Carnaval em 2013 "De perto ninguém é normal". Depois, nossa segundo "exercício de admiração" foi , em viagem ao triângulo mineiro, Ana Jacinta ou Dona Beja (ou Beija), mulher "insubmissa" do século passado.

Continuamos com o Projeto em 2013, homenageando Adiléa da Silva Rocha, grande Dolores Duran, Francisca Edwiges Neves Gonzaga, grande Chiquinha Gonzaga... Outras estrangeiras, como Emma Goldman ("Se não tem dança, não será a revolução que queremos") ... Oscar Wilde, que tem o túmulo cheio de beijos no Cemitério Père-Lachaise em Paris.  Recebíamos sugestões de SBCenses que se envolviam esse "exercício de admiração", trata-se de exercício muito interessante, que nos provoca, inclusive, o auto-conhecimento.

Foram surgindo outros projetos SBCenses... o SBC funciona assim, de um jeito meio anárquico... Todos os projetos estão sempre "em movimento", nunca terminam...

Pois bem, nessa semana decidimos retomar nosso projeto, pois nos "apaixonamos" por um grande brasileiro, praticamente esquecido por cerca de vinte anos, um médico, cientista, que teve que sair do Brasil mais ou menos no início deste século, para realizar seu sonho: 

Nicolelis em 2015

Miguel Angelo Laporta Nicolelis, hoje com 62 anos,  é um médico e cientista brasileiro, considerado um dos vinte maiores cientistas em sua área no começo da década passada pela revista de divulgação Scientific American. Foi considerado pela Revista Época um dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009. Nicolelis foi o primeiro cientista a receber no mesmo ano dois prêmios dos Institutos |Nacionais de Saúde estadunidenses e o primeiro brasileiro a ter um artigo publicado na capa da revista Science.

Lidera um grupo de pesquisadores da área de Neurociência na Universidade Duke (EUA), no campo de fisiologia de órgãos e sistemas. Seu objetivo é integrar o cérebro humano com máquinas (neuropróteses ou interfaces cérebro-máquina). Suas pesquisas desenvolvem próteses neurais para a reabilitação de pacientes que sofrem de paralisia corporal. Nicolelis e sua equipe foram responsáveis pela descoberta de um sistema que possibilita a criação de braços robóticos controlados por meio de sinais cerebrais.

No dia 12 de junho de 2014 Nicolelis e sua equipe realizaram a demonstração pública do EXOESQUELETO controlado pelo cérebro de um paciente paraplégico, na cerimônia de abertura da Copa do Mundo realizada no Brasil, colocando a ciência brasileira em evidência mundial. Aqui no nosso país a gente só se lembra da nossa derrota por 7 a 1 para a Alemanha...
Em 2020, foi publicado um livro de sua autoria intitulado “O verdadeiro criador de tudo: Como o cérebro humano esculpiu o universo como nós o conhecemos.” É o terceiro livro da trilogia iniciada com o livro “Muito Além do Nosso Eu” em 2011 e, em 2016, continuada pelo livro “Made in Macaíba”.

Nele, Nicolelis expõe sua tese de que o cérebro humano seria o centro do universo e tenta explicar a história, a cultura e a civilização humana com base em um conjunto de princípios-chave recém descobertos da função cerebral: “O Verdadeiro Criador de Tudo é uma estória sobre as criações do cérebro humano e a posição central que ele deveria ocupar na cosmologia do universo”.

Segundo o autor, a mente humana funciona de maneira relativa, ou seja, seguindo a ideia de que todo movimento é relativo, a mente humana também também seria dessa forma ao criar um modelo próprio de realidade, o qual é constantemente renovado com as informações que se obtém do mundo. Tal teoria é denominada por Nicolelis de Teoria do Cérebro Relativístico (TCR).

Com base na TRC, o autor se lançou no ambicioso projeto do supramencionado livro, que consistia em argumentar acerca da posição central do cérebro humano nas diversas áreas do conhecimento científico, não se limitando à neurociência. Em meio a essas explorações, Miguel Nicolelis deparou-se com o livro “A história da arte”, do historiador anglo-germânico Ernst H. Gombrich, o qual, nas palavras do autor, seria o “fio da meada” para consecução de seu projeto:

"Inesperadamente, eu havia achado um aliado, alguém que claramente podia ver que, sem um cérebro humano, moldado e refinado por um processo evolutivo, tão extremamente particular quanto irreproduzível, não existiria algo conhecido por nós todos como arte. Isso se deve ao fato de que todas as nossas manifestações artísticas, e as de todos os nossos antepassados, nada mais são do que produtos da incansável e inquisitiva mente humana, ansiosa por projetar para o mundo exterior as imagens mentais criadas nos confins do nosso cosmos neuronal interior".

Desse modo, observa-se que as ideias do autor influenciam também as Ciências Sociais, tendo em vista que, ao colocar o cérebro humano no centro do universo, isso traz implicações profundas que abrangem a forma de se interpretar o passado da humanidade, “como de reconhecer o nosso viver presente, bem como decidir que tipo de futuro queremos para nós e para os nossos descendentes”. Segundo o autor, toda a história da humanidade poderia ser contada e analisada do ponto das particulares abstrações mentais que dominaram cada uma das diferentes civilizações humanas, em diferentes momentos da existência.

Para Miguel, tanto a Física quanto a Arte são definidas por “uma coleção de construções e abstrações mentais gerada pelo cérebro humano e que oferece a melhor e mais acurada descrição – pelo menos até o presente – do mundo natural existente ao nosso redor”.

Por fim, na conclusão do livro, o autor lança um alerta sobre a crescente e cega capitulação da presente civilização às duas poderosas e perigosas abstrações mentais criadas pelo ser humano: Igreja do Mercado e Culto da Máquina. Assim, Miguel discorre que a convergência dessas duas abstrações mentais poderia nos condenar a retornar a um modo tribal de vida, “caracterizado pela existência fraturada e alienada da realidade do mundo natural que criará muitos riscos e incertezas para o Verdadeiro Criador de Tudo.”

E como o Nicolelis está, agora, presente nas nossas mídias alternativas, tanto no seu canal no Youtube como em entrevistas e  podcasts em outros canais? Em função do assunto do momento: a Inteligência Artificial... que ele diz que não tem nada de inteligência nem de artificial... o SBC adorou!!! Na nossa conversa sobre o assunto, teve gente que se lembrou dos anos 70, época em que fez seu curso superior, tinha um professor que contava experimentos já existentes em que "a tartaruga - antes comandada por uma máquina - começou, de repente, a andar sozinha..." Assim conta a pessoa, querendo nos dizer que, já naquela época, nos "assustavam" com o que seria a nossa história prospectiva, ou seja, seríamos "dominados" pela máquina. Naquela época líamos Isaac Asimov (1920-1992), escritor nascido na Rússia que vivia nos EUA, autor de obras de ficção científica. 

E, na nossa conversa agora, avaliamos que essa "aprendizagem" do medo das novas tecnologias, entre outros "medos", serve muito bem a um sistema que nos deseja alienados... e, portanto, longe de apropriarmos das mesmas a nosso favor, a favor do trabalhador, da qualidade de vida, de uma melhor distribuição das nossas riquezas e de um mundo mais bonito. Quem, então, se apropria, e "usa" para a dominação, para a acumulação, para o enriquecimento de uns poucos?


E assistimos várias entrevistas do Nicolelis...  e admiramos a simplicidade e a profundidade de um cientista reconhecido no mundo todo... 

Ele costuma falar por metáforas, o que causa um entendimento transparente das coisas. Diz que o cérebro funciona de uma maneira super dinâmica, através das interconexões... É uma grande orquestra que funciona sem maestro. Numa outra entrevista ele diz: "A mente humana é como se fosse uma bolsa de valores, ela não aufere o lucro baseado numa ação ou numa empresa, ela distribui essa função neural pelos bilhões de neurônios. A isso chamamos "modelo distribuído", ou seja, as perdas são compensadas". É o que ele diz, também, sobre a "plasticidade cerebral", a capacidade de "adaptação" do nosso cérebro, ou seja, a capacidade que o cérebro possui de se modificar de acordo com as necessidades e os estímulos do ambiente.

Ou seja, possuímos a capacidade de aprender durante toda nossa vida. Tem uma história de uma velhinha morrendo e as filhas não achavam uma vela... então uma delas pôs um montinho de areia na mão da mãe, que segurou um fósforo, e o acendeu. E a velhinha disse: "Vivendo e aprendendo".

A seguir umas das entrevistas que vimos, esta com o também grande jornalista brasileiro Breno Altman, no programa 20 minutos do canal Opera Mundi:


E terminamos lembrando de exercícios para estimular o cérebro como ler, conversar, rir, fazer amigos, falar poesias, cantar, dançar...

Como, por exemplo, lembrando da nossa grande  Lygia Fagundes Telles in : “A disciplina do amor (fragmentos)” Ed. Nova Fronteira :

Tão difícil a vida e o seu ofício. E ninguém ao lado para receber a totalidade (ou parte) do fardo. Os analistas, caríssimos, e na maioria, um lixo : um lixo Freud considerava a totalidade dos seres humanos, isso nos últimos anos da sua vida sem muita ilusão. Ele não conheceu seus discípulos. E por acaso é com o analista que se comenta a fita na saída do cinema? O livro. O sabor do vinho, esse gosto meio frisante, hem? E esta pele e esta língua. A minha tiazinha falava muito na falta que lhe fazia esse ombro amigo, apoio e diversão, envelheceu procurando um. Não achou nem o ombro nem as outras partes, o que a fez choramingar sentidamente na hora da morte, mas o que você quer, queridinha?! a gente perguntava. Está com alguma dor? Não, não era dor. Quer um padre? Não, não queria mais nenhum padre, chega de padre. Antes do último sopro, apertou desesperadamente a primeira mão ao alcance :  “É que estou morrendo e não me diverti nada!”


Brindemos: À VIDA!!!

Abraços carinhosos...