quinta-feira, 17 de outubro de 2024

... E AS ECO-POSSIBILIDADES DE SAÍDA...

Nosso post de semana passada repercutiu...virtualmente e  presencialmente. Foi motivo de novas conversas SBCenses que, acreditamos, fechamos com "chave de ouro" o ciclo de debates sobre ECOs. 

Ficamos de falar sobre ECOANSIEDADE... e surgiu o novo termo com prefixo ECO, a ECO ESPIRITUALIDADE. Estes são os temas deste post. 





Depois de comentários e recomendações sobre os dois filmes acima: Le déclin de l'empire américain (O declínio do império americano) é um filme canadense de 1986, comédia dramática, dirigido por  Denys ArcandTeve uma sequência, As invasões Bárbaras, em 2003...

Continuamos nossa conversa perguntando se ficou claro pra todos e todas a questão fundamental: a necessidade de superarmos esse sistema... superação, aqui, no sentido dialético. Vamos entender a dialética: primeiro como um movimento... (esses três pontinhos - reticências - que sempre usamos, serve para mostrar a ideia de movimento...)


Para Hegel, a dialética é responsável pelo movimento em que:

  • uma ideia sai de si própria (tese);
  • para ser outra coisa (antítese);
  • depois regressa à sua identidade, se tornando mais concreta (síntese). E a síntese contém a tese e a antítese... mas não é nenhuma das duas... e é, ao mesmo tempo...

Hegel também afirma que a dialética não é apenas um método, mas consiste no sistema filosófico em si. Segundo o filósofo, não é possível separar o método do objeto, por o método ser o objeto em movimento.

Segundo Marx e Engels, dialética é o pensamento e a realidade em simultâneo, ou seja, a realidade é compreendida através de suas contradições. Para a dialética marxista, o mundo só pode ser compreendido em um todo, a partir de um pensamento dialético que considere as contradições existentes.

Marx e Engels mudaram o conceito de Hegel, e introduziram um novo conceito, a dialética materialista. Segundo a teoria, os movimentos históricos ocorrem conforme as condições materiais da vida, os modos de produção e a luta de classes.

E conversamos sobre a superação dialética do sistema capitalista. Daí vimos a importância da consciência de classe: a que classe social você pertence? e vimos, também, como a ideologia capitalista esconde isso, ou seja, aliena, distancia, o trabalhador da consciência da sua classe. E o sujeito chega a perder essa consciência, chega a pensar, de fato, com a cabeça do patrão, ainda mais agora em que o patrão nem é concreto, ele - o trabalhador - se pensa como um empreendedor! 

Esse é o sistema - que precisamos enxergar... e combater. E esse é o sistema que alimenta de uma forma cruel  a distribuição tal das nossas riquezas, do nosso trabalho, da nossa produção, que repercute em pouquíssimas pessoas no mundo riquíssimas e inúmeras pessoas passando fome. E esse é o sistema que alimenta uma quantidade de pessoas entre essas duas categorias anteriores - que somos nós! - que, alienados da consciência de classe, o  "alimentamos" , nos colocando como OBJETOS, passivos, apenas reprodutores do mesmo... e não como SUJEITOS, desenvolvendo "visão de mundo" e conscientes de que podemos construir um mundo melhor.

E esse é o sistema que alimenta guerras, para a produção de armamentos. Tudo para o lucro e o poder...

E é esse o sistema que está produzindo em nós a ECO ANSIEDADE:

Trata-se de um  medo crônico de sofrer um cataclismo ambiental. É descrita como a preocupação associada ao futuro de si mesmo e das próximas gerações. A eco-ansiedade é uma variação das reações do transtorno de ansiedade, mas em relação a questões ambientais e às mudanças climáticas. Apesar de não ser considerada uma doença, é possível identificar a eco-ansiedade através de sintomas como stress, nervosismo, ansiedade e distúrbios de sono.

A expressão "eco-ansiedade" foi apresentada ao mundo em 2017 pela American Psychology Association (APA — a associação de psicologia do EUA), descrita como: "medo crônico de sofrer um cataclismo ambiental que ocorre ao observar o impacto, "aparentemente irrevogável" das mudanças climáticas, gerando uma preocupação associada ao futuro de si mesmo e das próximas gerações".... -Apenas em outubro de 2021 que ela entrou oficialmente para o dicionário de Oxford como um "desconforto ou preocupação sobre o dano atual e futuro causado no meio ambiente pela atividade humana e a mudança climática". Desde então, o termo tem aparecido com mais e mais com frequência, principalmente entre jovens.


No entanto o conceito foi criado desde 1989 por um grupo da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos. Seus membros eram Robert Greenway, Elan Shapiro, Alan Kanner, Mary Gomes e Theodore Roszak. Esse último lançou, em 1992, o livro “The Voice of The Earth: An Exploration of Ecopsychology”, três anos depois, em 1995, Gomes e Kanner lançaram o livro “Restoring the Earth, Healing the Mind”. Os dois livros são o alicerce fundador da Ecopsicologia e os responsáveis por difundir o movimento mundialmente, eles esquematizam uma abordagem que une psicologia e ecologia, propondo entender o ser humano e o mundo natural como uma unidade e não seres independentes, ou seja,  entender  ser humano e natureza como um continuum e não entes separados.

Assim, ao compreender melhor a conexão psíquica entre nós e a natureza, busca-se restabelecer a responsabilidade ética do ser humano com o planeta e com outras pessoas, pois o desequilíbrio e perda de vínculo com a natureza causa o desequilíbrio psíquico individual.

Voltando à ecoansiedade, os sintomas variam e podem incluir ansiedade leve, estresse, distúrbios do sono, nervosismo, entre outros. Em casos mais graves, a eco-ansiedade pode levar a uma sensação de sufocamento e até mesmo à depressão. Esses sintomas podem ser compreendidos como uma resposta racional a uma condição real, é a mente acendendo um alerta sobre a possibilidade do "fim do mundo" - ou fim do sistema, como vamos observar/refletir. Assim, apesar da Ecoansiedade não ser uma condição patológica, pode desencadear sérias respostas psicológicas. 

E como lidar com essa ansiedade ligada à percepção do nosso ambiente, às mudanças climáticas e tudo mais?  Como nosso grande Guimarães Rosa nos diz, "a mesma coisa que me mata pode me salvar", a notícia positiva no combate à eco-ansiedade é que os desafios climáticos estão despertando uma conscientização cada vez maior sobre a importância de cuidar do nosso  planeta. Refletindo sob outro ângulo, a "cura" passa pela consciência - busca de conhecimento, desenvolvimento de visão de mundo; por atitudes ou ações individuais - consumo responsável, atividades sustentáveis, prioridade a mobilidade e alimentação sustentáveis, ... ; e, importantíssimo, a participação, ou seja, o engajamento em grupos, projetos, iniciativas que combatam o "fim do mundo". Entendendo um pouco mais, querem que acreditemos que com o fim desse sistema em que vivemos ocorreria o fim do mundo... Na verdade o combate é ao fim do sistema, com a emergência de um mundo mais bonito,  ecológica e humanamente possível.

E essa linda do vídeo acima ainda nos sugere a aposta na esperança para além da indignação que paralisa... frente às narrativas de desencanto, vamos procurar - e oferecer, compartilhar, alternativas de encantamento... e o senso de comunhão como alternativa à desgraça. Obrigada grande Rita! Rita Von Hunty, conhecem? Vale a pena conhecer, cada vídeo no youtube é uma aula preciosa...


E chegamos ao conceito de ECO ESPIRITUALIDADE, que também nos aponta saídas que passam pela consciência e participação, se sentir e atuar enquanto sujeito, juntar forças com outras pessoas e buscar conhecer mais de política, economia... visão de mundo, enfim...

Lembrando: O prefixo “eco-” antes de “espiritualidade” vem do grego oikos, que significa casa – um lembrete de que “esta casa é a única que temos, estamos todos juntos, o que ocorre em Calcutá afeta Nova YorkSantiago do Chile e São Paulo”, disse o padre  chileno Fernando Díaz“É realmente uma casa comum, e essa casa comum está ameaçada”, acrescentou Díaz. “Estamos todos conectados, e essa é uma forma de entender esse lar que exige que olhemos além do racionalismo instrumental que nos guiou de um modo tão destrutivo no século passado.” 

Díaz, que trabalha há anos com o povo Mapuche no sul do Chile, descobriu que os povos indígenas têm uma visão mais holística da relação entre os seres humanos e os outros seres não humanos, que exige “uma perspectiva diferente, uma forma de entender como vivemos e por que vivemos nesta casa que é para todos, e onde todos devem ter um lugar, da qual devemos cuidar”. E acrescentou: “É aí que entra a ecoespiritualidade”, "uma forma de viver, uma conexão".

Moema Miranda vê um entendimento semelhante entre as pessoas no seu Brasil natal que lutam contra os impactos da mineração em suas comunidades.
O Brasil viu vários desastres relacionados à mineração nos últimos anos, incluindo a ruptura de uma barragem de rejeitos na mina de Brumadinho, que enviou uma cascata mortal de lodo tóxico pelas comunidades a jusante, e à expansão da mineração ilegal de ouro.
Miranda, leiga franciscana, faz parte da Rede Igrejas e Mineração, que, com a Verbo Filmes, produziu um vídeo que explica a ecoespiritualidade para pessoas que ainda não conhecem a ideia.


Enquanto teólogos brasileiros como Ivone Gebara e Leonardo Boff têm escrito há anos sobre a conexão entre a ecologia e a teologia, Miranda e outros membros da Rede Igrejas e Mineração queriam “entender como as comunidades que resistem à mineração fazem isso, onde as vítimas encontram forças para continuar resistindo”, disse ela. “Porque apenas aceitar o óbvio ou ser cortado pelo sistema parece o caminho mais fácil.”

Ao trabalhar com os pequenos agricultores, comunidades indígenas e afrodescendentes mais afetados pelas práticas de mineração, “percebemos que não se tratava simplesmente de teologia ecológica, mas também de uma espiritualidade, de algo muito mais profundo, um modo de vida, uma conexão”, disse ela.


"Essa presença espiritual não se encaixa no marco do racional, do teológico”, acrescentou. “É muito mais. Cada vez mais nos transformamos em uma comunidade ecoespiritual, porque a ecoespiritualidade se desenvolve em comunidade.”

E a querida Rita nos apresentou a pesquisadora brasileira Larissa Mies Bombardi, professora  do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP). As ameaças a essa pesquisadora  intensificaram-se após a publicação, na Europa, em 2019, do atlas "Uma geografia do uso de agrotóxicos no Brasil e suas relações com a União Europeia". O trabalho expôs a presença de resíduos agrotóxicos nos alimentos brasileiros. 

Vale a pena ler o seu livro, se não o livro todo pelo menos a orelha do livro, escrita por João Peres, jornalista e escritor:

"Para alguns, este livro servirá de ponto de partida para entender como foi possível que um único sistema agroalimentar se espalhasse física e ideologicamente pelo planeta. Para outros, será um ponto de interrogação: por que cultivos que não alimentam seguem se expandindo ano após ano — e, pior, contando com uma profunda complacência diante da promessa eternamente renovada de que a solução para o problema da fome está finalmente a caminho? No Brasil, a soja, esse grão exótico que nenhum de nós come, é o vetor de uma guerra cultural chamada agronegócio. É o micro-organismo que une o latifundiário dos Pampas ao grileiro de Santarém, no Pará; o prefeito no interior de Mato Grosso ao desembargador no litoral da Bahia; o cantor sertanejo ao dono do frigorífico. Debaixo de colheitadeiras e biotecnologia, por trás da face tech, o recurso didático é o mesmo de sempre: a pólvora. É o colonialismo na forma de venenos que os europeus já não querem e do mito da agricultura de precisão, que fumiga os vizinhos dos latifúndios, adoecendo o corpo e afetando a mente. Junto com o casco do boi, a soja transgênica expulsa o Guarani e o Kaingang no Sul, o beiradeiro da Amazônia e o geraizeiro no Cerrado. A onça, a sucuri e a capivara. O arroz, o feijão e a mandioca. Expulsa, violentamente, a crítica — inclusive a de Larissa, obrigada a se mudar para a Bélgica após uma série de episódios traumáticos. Quando tudo já era suficientemente trágico, eis que o agronegócio e o mercado financeiro encontraram no bolsonarismo a possibilidade de catapultar a acumulação primitiva e a destruição do planeta. Desse encontro nasceram o dinheiro e a estrutura necessários para dar ritmo de progressão geométrica à expansão da soja, que ameaça se tornar a primeira cultura agrícola a reinar do extremo sul ao extremo norte do país. O futuro não está nas páginas do livro de Larissa: é ao presente que ela nos convida, à urgência de um fim de mundo que se apresenta voraz. A pesquisadora reflete sobre a perseguição à cultura camponesa — especialmente às mulheres — e nos conclama a entender por que os conhecimentos acumulados ao longo  de séculos são a única esperança de nos salvarmos do capitalismo."

Enfim, alguma dúvida sobre esse sistema em que vivemos e sua necro política, necro economia, tudo em função do lucro, da riqueza de poucos em detrimento da destruição do planeta e do ser humano?


E alguma dúvida sobre o ser humano bio-psico-social-espiritual? tudo junto e misturado ... e SUJEITO, não apenas objeto, reprodutores do sistema, mas capazes de "chutar o pau da barraca", de não perdermos o mínimo de oportunidade de construirmos um  mundo melhor, do micro ao macro E, enquanto sujeitos, conversarmos sobre os múltiplos caminhos, inter e multidisciplinar, economia, ecologia, geopolítica, espiritualidade, consciência de classe... tudo junto e misturado, de novo...

E assim pensa o SBC, um conceito de qualidade de vida e de relações...


E terminamos com Paulinho da Viola, pois, como sabem, o SBC sempre usa a arte como mobilizadora, inspiração, impulsionamento para o desenvolvimento da visão de mundo e a construção do bem viver:

"As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender..."


Abraços carinhosos às pessoas que nos leem... até nossa próxima reflexão...

Santuza TU







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