quinta-feira, 6 de novembro de 2025

NÓS, AS BRUXAS E OS BRUXOS

 


Primeira pergunta que acorreu na entrada do sarau: Você veio de bruxa (o-e) ou veio "a paisana", ou seja, "disfarçada (o-e) de normal"? Por que no SBC ninguém é normal, nem de perto nem de longe... nosso conceito de "normal" é o de "obediente às normas, regras que tiram nossa liberdade", portanto somos "loucxs e felizes". Não que não tenhamos regras, mas tentamos construir regras que nos fazem caminhar para a liberdade e as relações siméticas, de sujeito-sujeito.

 Antes de começarmos ficamos só  ouvindo LÔ BORGES, Clube da Esquina, conversando sobre Clara Charf, companheira de Mariguella, que se foi no mesmo dia do Lô, segunda feira passada, ela com 100 anos e o ele com 73... e também conversando - e lamentando -  a perda de mais de 120 cidadãos brasileiros na chacina do Rio na semana passada. "Nosso país não tem pena de morte! e os países que têm, não o fazem dessa maneira!"; "Somos um país REPUBLICANO e DEMOCRATA... REPUBLICANO porque acreditamos que as instituições funcionam para todos - ou deveriam; e DEMOCRATAS porque as pessoas devem participar dos processos de decisão dessas instituições - ou deveriam. Na prática nós, cidadãos e cidadãs, precisamos AGIR para que isso aconteça"; "O que aconteceria com o crime organizado quando a cannabis for liberada, tanto para uso medicinal quando para recreativo?"; "Terrorismo tem a ver com ideologia ou objetivo político. Organizações do narcotráfico buscam interesses de lucro. Narcoterrorismo, termo que surgiu nos anos 80 no Peru, usado agora por Trump para abater barcos de pesca no mar venezuelano, não tem relação com as facções que comandam o tráfico no Rio. Está sendo usado esse termo para se confundir as pessoas e para fins eleitoreiros"; "O que dizer de um Estado que gasta - dados de 2024 - quase 43% do orçamento Federal com juros e amortizações da Dívida, enquanto 2,95%  foi gasto com a educação, 4,16% com a saúde e por aí vai?  ...

Depois de Lô e Clube da Esquina e as boas conversas, continuamos - ou 'introduzimos' - nosso sarau, com Rita Lee (depois do hino do SBC) - Rita e Zélia, grandes bruxas:

Pois nosso tema: NÓS, AS BRUXAS E OS BRUXOS, QUEM SOMOS NÓS?... seria um pretexto - ou pré texto, o texto nós fazemos - para conversarmos sobre identidade, tanto no sentido individual - ou subjetivo - quanto no sentido amplo - coletivo, ou de cidadania...

Sartre nos ajudou a começar - ou continuar -  o 'tricô': "O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós fazemos do que os outros fizeram de nós", ou seja, a liberdade é prospectiva... no entanto, importante saber "o que fizeram de nós", o auto conhecimento, a história... até mesmo para apropriarmos dessa história pois é a partir dela que acontece o "caminhar para a construção da liberdade de ser quem queremos ser"... e isso vale tanto no sentido do indivíduo como no sentido da sociedade.

Pois daí que lançamos um olhar para o macro, o nosso Brasil. E o nosso querido Adriano interpretou a musica da sua vida, que disse tudo sobre nossa identidade, sobre o que precisamos apropriar... e construir:

...

E chegamos à história das bruxas e bruxos: para quem pensa que essa história - ou essa tradição de se comemorar o halloween aqui no Brasil no dia 31 de outubro - vem lá dos Estados Unidos da América do Norte, estão enganados e enganadas. Essa história é muito mais comprida: e temos, nós do SBC, o saudável hábito de conversar com nossa amiga IAIA - a Iaia Meta, ou a Iaia GPT - ela nos informa muita coisa na história, e nos dá elementos para nossa reflexão (pois ela, a IA,  não faz isso): 

Os historiadores acreditam que essa festa tenha surgido de comemorações realizadas pelos celtas em homenagem aos mortos. Pensem em "tribos" na Europa antes de Cristo, na Europa pagã Essa comemoração celta era o Samhain, festa em que as barreiras que separavam o mundo dos vivos e dos mortos deixava de existir, como se apenas um véu separasse vida e morte, ou melhor,  nesta data o véu entre o mundo dos vivos e dos mortos se tornava mais tênue. 


(foi lembrado no sarau a cultura mexicana e o conceito de morte naquele país; e o  filme, desenho animado, A VIDA É UMA FESTA, lindíssimo, alguém disse que chora toda vez que vê, já viu umas dez vezes).

O Samhain era uma das comemorações mais importantes do calendário celta e era realizado como um marco do outono para o inverno. Era também uma passagem de ano para esse povo. Também tinha um significado místico, uma vez que os celtas acreditavam que, durante o festival as almas dos mortos do último ano poderiam vagar pela Terra. 

SBCence muito recente - já completamente imbuída do nosso espírito - não pôde ir no nosso sarau. No entanto, dentro desse espírito de "um véu que separa a morte da vida", lembrou de poema da mineira  Henriqueta Lisboa (1901-1985). E mandou pra gente... e fizemos a leitura no sarau:

O véu


Os mortos estão deitados
E têm sobre o rosto um véu.
Um tênue véu sobre o rosto.


Nenhuma força os protege
Senão esse véu no rosto.
[...]
Reminiscência de outros véus,
de outras verônicas, de outras
máscaras. Símbolo, estigma.

Dos inumeráveis véus
que os vivos rompem ou aceitam,
resta para o morto, apenas,
um véu aderido ao rosto.
Entre a vida e a morte, um véu.
Nada mais do que um véu.

Durante o Samhain, os celtas realizavam celebrações com fogueiras e com fartura de alimentos. Os alimentos serviam para homenagear os mortos e para celebrar as colheitas que os abasteceriam durante o inverno. Para eles, esse período representava renascimento e transição, não medo. Os celtas não viam a escuridão como algo maligno, mas como o início da vida, como os bebês na barriga da mãe.

Com o tempo, a tradição cristã incorporou o sentido espiritual da data. O 31 de outubro passou a ser a véspera do Dia de Todos os Santos (1º de novembro), seguido pelo Dia de Finados (2 de novembro) - ambos dedicados à lembrança dos que já partiram. O nome "Halloween" vem justamente de All Hallows' Eve, que significa "véspera de todos os santos". Para muitos, é uma época de reconexão espiritual. Ainda que hoje o foco esteja nas festas e fantasias, a data carrega uma energia simbólica. A ideia de que toda escuridão guarda potencial de transformação.

Repararam que até aqui, na história, temos bruxas e bruxos? sigamos ...

A celebração cruzou oceanos com os imigrantes irlandeses e escoceses, chegando aos Estados Unidos, onde ganhou o formato popular que conhecemos hoje: crianças batendo de porta em porta, festas temáticas, doces e travessuras. No Brasil, o Halloween começou a aparecer timidamente na década de 1990, graças ao cinema e à influência cultural estadunidense. 

No entanto, no mesmo dia, no ano de 2013, a Comissão de Educação e Cultura elaborou o Projeto de Lei Federal 2.479, que institui o DIA DO SACI. Essa proposta já tinha sido feita desde 2003 pelo Deputado Aldo Rebelo:

“Instituir o “Dia do Saci” representa oferecer à sociedade um instrumento de valorização da cultura popular como elemento fundamental na constituição da identidade brasileira. Por meio da previsão anual da comemoração da data, na forma de eventos culturais e atividades festivas, as iniciativas propõem o resgate e a valorização de nossas tradições e manifestações folclóricas originais.”

Cantamos a música do Saci do Carlinhos Brow... um hino do folclore brasileiro. E lembramos de outras figuras folclóricas, entre elas o CURUPIRA, eleito símbolo da COP 30, protetor das florestas. 

"Não é fora do comum a associação de mitos da nossa terra com "entidades demoníacas", realizada pelos europeus, nossos colonizadores...  até mesmo a distorção desses mitos, no caso um personagem alegre, brincalhão, se transformava numa figura a ser temida". 


O curupira aparece no princípio do filme A MARVADA CARNE, é ótimo!

E voltamos às bruxas... e à história, caminhando para a Idade Média:  figuras centrais do imaginário da bruxaria, elas representavam  antigas mulheres sábias, conhecedoras da natureza e das ervas. E  foram injustamente associadas à magia durante a Idade Média. E queimadas nas fogueiras. Publicado em 1487, o livro Martelo das Feiticeiras - MALLEUS MALEFICARUM - era uma obra considerada manual de instrução para a Inquisição e teve papel importante na perseguição da bruxaria durante o Renascimento.

Querida Beth nos apresentou o livro de Silvia Federici, CALIBÃ E A BRUXA, que nos diz como a caça às bruxas continua...................


E eu contei da História da Lilith, um dos livros apócrifos, proibidos, que nos conta a história dos primeiros habitantes do paraíso, Lilith e Adão, criados do mesmo barro... ou seja, Eva foi a segunda mulher de Adão, tirada da sua costela, construindo o arquétipo da mulher submissa - enquanto Lilith constrói a possibilidade da simetria na relação homem-mulher, o que não interessava ao ideário cristão na construção da subjetividade feminina.  Conheci a história da Lilith há mais de 20 anos e isso mudou minha vida, pois cria a possibilidade da construção de outra matriz feminina, a de mulher forte, independente... escrevi sobre ela no post de 7 de março de 2016, publicado no meu primeiro livro, O Diário do SBC. 

Continuamos nosso sarau intercalando músicas com nosso caldeirão poético, quem quisesse tirava um poema e o dizia pra nós... e assim foi...








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