quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Conversas SBCenses: O SENTIDO DA VIDA

Ouvi essa estória e meu é só o jeito de contá-la. De uma amiga que sofreu um acidente, por volta dos anos 2005, que mudou sua vida. 

Nessa época ela estava no terceiro período da faculdade. Uma parte da turma -  eram 14 pessoas - alugou uma van para irem a uma festa. No meio do caminho o motorista sofreu um infarto fulminante e enfiou a van num barranco. Fora o motorista que já estava morto, morreram, no local, 12 alunos. Ela e uma outra pessoa foram transferidas para BH para o Hospital de Pronto Socorro João XXIII. 

A outra pessoa viveu por mais três dias e sucumbiu.

Ela se encontrava com o pulmão perfurado, pernas quebradas, mandíbula fraturada, entre outras coisas. Para se manter viva, a primeira providência foi segurar a perna pra cima naqueles aparelhos e cuidar do pulmão. Foi transferida de hospital para uma cirurgia inédita, como uma espécie de cobaia de um médico que tinha acabado de chegar ao Brasil. Deu certo... Depois, fisioterapia respiratória... recuperação... 

E aí começaram os outros cuidados: a perna, a mandíbula... aí ela já conseguia sentar...

E ela ficou como a única sobrevivente... pra contar essa estória.

Cinco meses depois, ainda em cadeira de rodas, ela volta à faculdade... consegue formar ainda junto com sua turma. E, agora, cerca de 20 anos depois, ela é professora no colégio onde foi aluna, o que era seu sonho...


E, com este relato, começamos a praticar o que existe de mais humano: a troca, oferecer sua experiência para que o outro cresça com ela... e vice versa.

Querida, meu convite é para que você nos aponte, em itens, os que considera mais importantes como aprendizagem de vida a partir desse acontecimento?

1. Calma... respire fundo... a vida não é para ser vivida com pressa. respiração diafragmática, algumas pessoas aprendem (ou reaprendem) com ioga, outras com o canto, eu aprendi com esse acidente; desde criança aprendemos a conter nossa respiração e reprimir nossas emoções;

2. Paciência... principalmente com os limites do outro;

3. Primeiro objetivo na vida: estar viva;

4. Segundo, comecei a estabelecer objetivos de vida a curtíssimo prazo. Primeiro, estar viva, segundo, respirar; depois sentar na cadeira... nada de metas inatingíveis. O próprio corpo te diz isso, de coisas que ele dá conta e que não dá conta. Se eu não conseguia mexer, como iria conseguir levantar e ir para a faculdade?

5. Porém, a médio e longo prazo, comecei a recuperar meus sonhos: voltar para a faculdade, terminar o curso e dar aula na escola onde estudei.

6. Todo esse processo, vivido dessa maneira, não foi doloroso... na verdade foi um processo suave, pois uma outra aprendizagem fundamental foi a aceitação... a aceitação da vida como ela se colocou para mim. A filosofia oriental nos ensina isso: a terapia da conformação, se conformar com o que não pode ser mudado... tudo o mais, arregace as mangas e mude o que você acha que deve ser mudado...;

7. Era um momento em que eu não me fazia a pergunta por quê... eu tinha que, apenas, seguir... eu trocava o por quê pelo COMO... como posso retomar minha vida, meus desejos, meus planos...

8. E, concluindo, a reflexão sobre o sentido da vida: na verdade a vida não vale nada... rsrs ... nós é que damos sentido a ela... uns buscam na religião, no pós vida, essas coisas que, na maioria das vezes, geram uma alienação, um distanciamento, uma não apropriação da sua vida, da responsabilidade no sentido de "responder por" ser sujeito, pela apropriação da sua vida, por colocá-la "nas suas mãos".

Mas para além do misticismo, nossa sociedade nos "ensina", também,  a buscar esse sentido de vida no TER... e aí, diante de uma crise é que nos damos conta do SER... e da simplicidade da vida. 

Me fez lembrar um filme que devo ter visto há cerca de 15 ou 20 anos. Não me lembro se reproduzo o filme ou criei outro filme no meu "globo pensante", como diz um amigo - e "sentinte", eu acrescento. Trata-se de um curta - cerca de cinco minutos - que faz parte de vários pequenos filmes, de cineastas que fizeram uma homenagem a Paris... e o longa se chama Paris, te amo. Acho que este é o último filme. De uma mulher americana, de meia idade, ela se encontra em depressão... e está aprendendo francês. Então seu médico lhe recomenda fazer uma viagem a Paris a fim de treinar a língua. E o filme é um relato dela mesma, em off, dessa viagem. É divertido seu relato, assim como as dificuldades que ela passa em função de seu pouco conhecimento da história e da cultura do país. Me lembro de sua visita ao cemitério Montparnasse, o segundo maior cemitério de Paris (o primeiro é o Père Lachaise, um dos mais famosos do mundo; localizado no 20º distrito, atrai centenas de milhares de visitantes que querem ver os túmulos de pessoas famosas; inaugurado em 1804, também abrange três memoriais da Primeira Guerra mundial).

O filósofo Jean-Paul Sartre e a escritora Simone de Beauvoir, sua mulher, dividem um túmulo em Montparnasse. E nossa personagem, ao visitar esse túmulo comenta: "Não sei muito bem porque o filósofo Sartre está enterrado junto com um tal de Simon Bolívar, segundo minha pesquisa no google, um  revolucionário venezuelano que jurou defender a independência da América do Sul  e dedicou sua vida à luta contra os espanhóis. Auxiliou nos processos de independência da Venezuela, Colômbia, Peru e Bolívia"...  kkk ... rimos muito...

Simon Bolívar (1783 - 1830).

E ela continua seu dia em Paris, com acontecimentos desse tipo, que ela relata num tom triste... até que, ao final da tarde, ela se senta num banco de um jardim... e, olhando ao seu redor, diz: "e, ao final do dia, sentada aqui nesse jardim e olhando ao redor, um sentimento de doce alegria se apossou de mim... e descobri que a vida é simples...  basta olhar ao redor... e agradecer o simples fato de estar viva".

Querida, eu não tenho a mínima ideia se foi isso mesmo que ela disse... acho que criei outra frase sobre o que ela disse no banco do jardim, a partir do que você me contou da sua vida... eu diria, uma "licença poética". 

Rimos, nós duas, sentadas na calçada esperando o busão, depois de termos subido uma grande ladeira de Ouro  Preto - é o que mais tem nessa cidade, subida e descida -  e contemplando  uma das inúmeras paisagens dessa cidade linda...


Obrigada, querida, pelo bom encontro...

Abraços carinhosos...





5 comentários:

  1. Que tragédia!!! Desconhecia....obrigada por compartilhar experiência tão impactante, q muito nos ensina sobre o valor de nossas vidas....e, sobre como somos frágeis, fugazes,ao nesmo tempo, potentes, corajosos,resilientes....muito comovente e educativa a experiência de sua amiga....parabéns....que Deus a abençõe muito mais

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  2. Adorei Tú! Delícia de história! Beijos da Sossô!

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  3. Ótimo compartilhamento!!Gratidão!!!

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