sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Na beira do fogão: conversando sobre DEMOCRACIA

 



Este foi o fogão da nossa conversa sobre DEMOCRACIA. A foto foi tirada depois, no dia estávamos tão envolvidxs com a conversa que não lembramos. Algumas pessoas levaram informações do GOOGLE, outras levaram referências de livros e filmes... e eu fiquei encarregada de fazer a resenha (e ilustrações)... a seguir:


palavra democracia tem origem no grego demokratía que é composta por demos (que significa "povo") e kratos (que significa "poder" ou "forma de governo").

 A democracia é a possibilidade de exercício político por parte do povo. Trata-se de um regime político em que todos os cidadãos elegíveis participam igualmente — diretamente ou através de representantes eleitos. Os gregos antigos criaram a ideia de cidadania, aquele que é considerado cidadão poderia exercer o seu poder de participar da política da cidade. Reparem que não era inclusiva a democracia grega, e isso foi a uns 300 anos antes de Cristo. Os escravos e as mulheres não estavam incluidxs, eram serem "inferiores".

A democracia grega era, portanto,  restrita. E essa ideia começou a mudar a partir da Revolução Francesa que, por meio do republicanismo, passaram a advogar por uma participação política de todas as classes sociais. Ainda na Modernidade, apesar de avanços políticos e de uma ampliação do conceito de democracia, as mulheres não tinham acesso a qualquer tipo de participação democrática ativa nos países republicanos, fato que somente começou a ser revisto com a explosão do movimento feminista das sufragistas, que culminou na liberação, pela primeira vez na história, do voto feminino, na Nova Zelândia, em 1893 (ou seja, pouco mais de 100 anos).


As democracias podem ser classificadas quanto aos tipos diferentes, com base no modo como se organizam. E, também, podem apresentar diferentes estágios de desenvolvimento. Por isso, o termo é amplo e de difícil definição, pois o simples ato de dizer que “a democracia é o poder do povo" ou de associar democracia à prática de eleições não define o conceito em sua totalidade.

Temos três tipos básicos de democracia:

§  Democracia direta

É a forma clássica de democracia exercida pelos atenienses. Não havia eleições de representantes. Havia um corpo de cidadãos que legislava. Os cidadãos reuniam-se na ágora, um local público que abrigava as chamadas assembleias legislativas, onde eram criadas, debatidas e alteradas as leis atenienses. Cada cidadão podia participar diretamente emitindo as suas propostas legislativas e votando nas propostas de leis dos outros cidadãos. Os cidadãos preparavam-se, mediante o estudo da Retórica, do Direito e da Política, para as assembleias.  As decisões, então, eram tomadas por todos. Exercemos, agora, esse tipo de democracia? Sim, claro, podemos e devemos exercê-lo nas nossas comunidades. E mais, nos preparar para isso, para defender nossas opiniões, argumentar,  ouvir x outrx e elaborar consensos. Isso vem a ser a aprendizagem do "exercício da cidadania" ou "fazer política". 

§  Democracia representativa (ou indireta)

Pela existência de vastos territórios e de inúmeros cidadãos, é impossível pensar em uma democracia direta, como havia na Grécia. Vários fatores contribuíram para a formação desse segundo tipo de democracia: o voto (sufrágio universal); a Constituição,  que regulamenta a política, a vida pública e os direitos e deveres de todos; a igualdade de todos perante a lei, o que está estabelecido pela Constituição. Vejam que Direitos Humanos está diretamente relacionado à Democracia.

Então... as democracias representativas são regidas por constituições que estabelecem um Estado Democrático de Direito. Nessas organizações políticas, todo cidadão é considerado igual perante a lei, e todo ser humano é considerado cidadão. Não pode haver desrespeito à constituição, que é a carta maior de direitos e deveres do país, e os cidadãos elegem representantes que vão legislar e governar em seu nome, sendo representantes do poder popular nos poderes Executivo e Legislativo.

vantagem desse tipo de organização política é a exequibilidade, e sua desvantagem é a brecha para a corrupção e para a atuação política em benefício do bem privado e não do bem público. Por ser um sistema em que a participação política não é exercida diretamente, mas por meio de representações, ele é chamado de democracia indireta. E a característica principal da democracia representativa é a eleição dos nossos representantes.

§  Democracia participativa (ou semi direta)

Nem uma democracia direta, como era feita na Antiguidade, e nem totalmente indireta, como acontece com a democracia representativa, a democracia participativa mescla elementos de uma e de outra. Existem eleições que escolhem e nomeiam membros do Executivo e do Legislativo, mas as decisões somente são tomadas por meio da participação e autorização popular.

Essa participação acontece nas assembleias locais, em que os cidadãos participam, ou pela observação de líderes populares, nas assembleias restritas, que podem ou não ter direito a voto. Também acontecem plebiscitos para ser feita uma consulta popular antes de tomar-se uma decisão política. Esse tipo de democracia permite uma maior participação cidadã, mesmo com a ampliação do conceito de cidadania e pode ser chamada democracia semidireta.



sistema político brasileiro pode ser chamado de representativo, mas a nossa Constituição Federal de 1988 permite uma ampla participação popular que, caso fosse efetivamente aplicada, poderia colocar-nos no patamar de democracia participativa, inclusive prevendo a possibilidade de uma iniciativa popular legislativa.

Perceberam que DEMOCRACIA está intimamente relacionada com EDUCAÇÃO, com DIREITOS HUMANOS, com PARTICIPAÇÃO e CIDADANIA. E com POLÍTICA, que fazemos o tempo todo, "na cama e no mundo", e precisamos aprender a fazer politica de um jeito mais bonito, mais inclusivo, mais saudável, enfim, uma politica que defenda, essencialmente, a VIDA.

Quando um Estado Democrático de Direito, representado pela Constituição, é, por algum motivo, suspenso, interrompido ou deixado de lado, podemos dizer que há a formação de um Estado de exceção, que é uma das características de uma ditadura.

Dessa breve elucidação do conceito, partimos para a compreensão da Democracia no Brasil: Como tantas outras coisas no nosso país, a relação entre democracia e política aqui é complicada. Na Primeira República,  ou República Velha, tivemos um período provisório comandado por setores militares (1889 - 1894). Um período em que a chamada “política café com leite” deu início a um longo conchavo entre líderes de São Paulo e Minas Gerais para a presidência do país. Em 1930, uma chapa liderada por Júlio Prestes, paulista, é indicada e eleita. Porém os políticos mineiros não aceitam a eleição, iniciando a Revolução de 1930, que acaba com a república e inicia a Era Vargas. Uma característica da Primeira República era o voto de cabresto, em que os coronéis locais mandavam e fiscalizavam as pessoas quando votavam, criando uma fraude que descaracteriza a legitimidade do processo democrático. A democracia só foi restabelecida no Brasil em 1945. E, em 1964, o país vive outro golpe contra a república brasileira e contra a democracia. Trata-se do golpe civil-militar, que impôs um regime de exceção, suspendendo direitos civis e a constituição, impondo a censura contra a imprensa e fechando, o Congresso Nacional.

Pois, como podemos ver, só existe democracia com o funcionamento dos três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, cada um com suas atribuições específicas.


Imprescindível, para entender melhor a democracia no nosso país, principalmente nos últimos anos, o filme "Democracia em vertigem", documentário de 2019 indicado ao Oscar em 2020, dirigido por Petra Costa, que relata os bastidores do impeachment da Presidenta Dilma, o julgamento de Lula e o pleito que elegeu o candidato de extrema-direita.

Voltando a história, em 1985, a ditadura militar acaba, mas deixa como marca as eleições indiretas para presidente. O grande movimento, iniciado ainda no fim da ditadura, o "Diretas Já", pedia o estabelecimento de eleições diretas para presidente. Em 1988, acontece a Assembleia Constituinte que cria a Constituição Federal de 1988, a Constituição Cidadã, e restabelece a possibilidade da democracia plena, reforçando direitos e promovendo a igualdade.

Percebemos que nossa Democracia ainda é muito frágil. O respeito a essa democracia, até mesmo por parte de representantes do Legislativo, do Judiciário e do Executivo, e por parte da população civil, ainda é um problema, pois o que mais temos visto é a violação dos valores constitucionais por parte de políticos eleitos pelo povo. E o povo, nós, ou um tanto de nós, na alienação, na falta de educação política, nos deixamos levar pela "superfície" das informações, pelas informações falsas, que nos impõe um Simulacro,   um modelo cultural, que seguimos sem reflexão. 

Pois com conversas e reflexão fica fácil de ver que um conceito (e a prática) de democracia  é aquele onde o governo  preserva o legítimo direito de expressão e de existência das minorias, um governo para todos. E outro conceito (e a prática) de democracia é o "governo da maioria", a "minoria" tem que se adaptar, ou se submeter, ser explorada, massacrada, vilipendiada. Com todo o "encobrimento" necessário, isto é, a ideologia, ou o que se chama  "Guerra Cultural" que, num sentido geral, significa a tentativa de imposição de padrões, entendida (e praticada) como "o meu jeito de pensar, meus princípios, meus valores, são a verdade absoluta... e quem não compartilha dessa verdade deve ser eliminadx... este  é o entendimento atual de "guerra cultural". A "polarização", o maniqueísmo, "certo ou errado", feio ou bonito, céu ou inferno, homem ou mulher... só interessam à dominação. O humano é muito maior do que dois lados... é uma construção constante...

 

                                                            Jacques Rancière. 1940...

O seu livro O ódio à democracia,  o filósofo francês contemporâneo Jacques Rancière fala sobre   a crise democrática que tem assolado os países no século XXI. Segundo ele, o mundo tem agido contra a democracia por uma espécie de medo que ela pode colocar no cidadão médio: o medo de que a democracia seja o regime político por excelência.

Rancière afirma que a democracia é o regime do dissenso, e isso tem promovido a cisão da população. É normal que haja discordância dentro de um regime democrático, mas deve haver também respeito mútuo por todas as partes que respeitam a democracia, e deve haver uma tentativa de construir-se um projeto comum com base na discordância.

A partir do momento em que setores autoritários não respeitam os seus adversários, tem-se início um processo de ódio contra a democracia que pede o fim dela para que o adversário e a sua posição política sejam eliminados. É daí que surge o anseio pela ditadura.



"Neste ensaio, publicado em 2005 na França, Jacques Rancière, um dos mais importantes filósofos da atualidade, conduz o leitor por um passeio pela história da crítica à democracia para situá-la no cerne político do momento atual, procurando esclarecer o que há de novo e revelador no sentimento antidemocrático, uma manifestação tão antiga quanto a própria noção de democracia. Dessa forma, Rancière repensa o poder subversivo do ideal democrático e o que se entende por política, para assim encontrar o caráter incisivo de sua ideia. O livro ganha edição em português pela Boitempo Editorial em um momento único da política brasileira, no contexto de um cenário eleitoral surpreendente, que sintetiza a efervescência social dos últimos anos, revelada com mais intensidade nas manifestações sociais de junho de 2013. A obra mostra-se atual também em relação ao debate que vem crescendo sobre participação e representação popular, democracia direta e o desejo de que a política signifique mais do que uma escolha entre oligarcas substituíveis. "É justamente essa recusa da hierarquia que tem a ganhar com a leitura deste livro de Jacques Rancière que, à luz dos clássicos como da experiência francesa e mundial, continua um trabalho sempre renovado, jamais concluso, de afiar o gume da democracia", afirma o filósofo Renato Janine Ribeiro no texto de orelha do livro".


Renato Janine Ribeiro, !949-... professor de filosofia, cientista político, escritor e colunista brasileiro, também autor do livro A DEMOCRACIA, que acrescentamos como referência importante para nossas conversas.

E assim terminamos nossa conversa, com sugestões de outros temas, que estão elencados no post do "lançamento" do projeto, assim como sugestões de outros lugares para a próxima conversa... e lembrando (e cantando) o grande GONZAGUINGA:


A música "Comportamento Geral", foi lançada em 1973. Ao apresentar a música a um júri do antigo programa Flávio Cavalcanti, Gonzaguinha foi "massacrado". Um dos jurados sugeriu sua deportação. A música teve sua execução pública proibida, mas a venda em disco para audição particular foi permitida. 

E como é atual! Vejam a letra! Afinal, nem no tempo da ditadura militar tentaram acabar com os direitos trabalhistas, com a aposentadoria, só falta, como diz a letra da música, acabarem com o carnaval.
 
"Você deve notar que não tem mais tutu / e dizer que não está preocupado
Você deve lutar pela xepa da feira / e dizer que está recompensado
Você deve estampar sempre um ar de alegria / e dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão / e esquecer que está desempregado
Você merece, você merece / Tudo vai bem, tudo legal / Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé / Se acabarem com o teu Carnaval?
Você merece, você merece / Tudo vai bem, tudo legal / Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé / Se acabarem com o teu Carnaval?
Você deve aprender a baixar a cabeça / E dizer sempre: "Muito obrigado"
São palavras que ainda te deixam dizer / Por ser homem bem disciplinado
Deve, pois, só fazer pelo bem da Nação / Tudo aquilo que for ordenado / Pra ganhar um Fuscão no juízo final / E diploma de bem comportado
Você merece, você merece / Tudo vai bem, tudo legal / Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé / Se acabarem com o teu Carnaval?
Você merece, você merece / Tudo vai bem, tudo legal / Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé / Se acabarem com o teu Carnaval?

Você merece, você merece / Tudo vai bem, tudo legal
 E um Fuscão no juízo final / Você merece, você merece
 E diploma de bem comportado / Você merece, você merece
 Esqueça que está desempregado / Você merece, você merece/tudo vai bem, tudo legal"

E outra, que cantamos, do mesmo Gonzaguinha e da mesma época, anos 70, aqui interpretada pela maravilhosa Elza Soares:


"Memória de um tempo onde lutar por seu direito

É um defeito que mata

São tantas lutas inglórias
São histórias que a história
Qualquer dia contará

De obscuros personagens
As passagens, as coragens
São sementes espalhadas nesse chão

De Juvenais e de Raimundos
Tantos Júlios de Santana
Dessa crença num enorme coração

Dos humilhados e ofendidos
Explorados e oprimidos
Que tentaram encontrar a solução

São cruzes sem nomes
Sem corpos
Sem datas

Memória de um tempo onde lutar por seu direito
É um defeito que mata

E tantos são os homens por debaixo das manchetes
São braços esquecidos que fizeram os heróis
São forças, são suores que levantam as vedetes
Do teatro de revistas, que é o país de todos nós

São vozes que negaram liberdade concedida
Pois ela é bem mais sangue
Ela é bem mais vida
São vidas que alimentam nosso fogo da esperança
O grito da batalha
Quem espera, nunca alcança

Ê ê, quando o Sol nascer
É que eu quero ver quem se lembrará
Ê ê, quando amanhecer
É que eu quero ver quem recordará

Ê eu, não posso esquecer
Essa legião que se entregou por um novo dia
Ê eu quero é cantar essa mão tão calejada
Que nos deu tanta alegria
E vamos à luta"

E terminamos como a Elza:

QUE PAÍS É ESSE!!!

VAMOS LUTAR POR UM PAIS MAIS INCLUSIVO, MAIS HUMANO, MAIS DEMOCRÁTICO! 

Até nosso próximo encontro, talvez na varanda.

Abraços carinhosos

SantuzaTU


5 comentários:

  1. Excelente trabalho de pesquisa e reflexão. Penso que será um projeto produtivo e prazeroso. A formação é uma das mais importantes ferramentas para a mudança. Parabéns Santuza. Você se superou com este texto.

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  2. Muitissimo obrigada querida amiga Antonieta. TMJ

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  3. Muitíssimo obrigada querida amiga Antonieta! TMJ

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