segunda-feira, 6 de setembro de 2021

ARTES NA PANDEMIA: conto do Sérgio , mais novo SBCense



Sérgio Miguel Cardoso, ou Sérgio Cardoso... mais recente “aquisição” do SBC:

Iniciou carreira artística como ator muito cedo, aos cinco anos de idade atuando em peças infantis no Grupo Escolar Barão do Rio Branco onde cursou o primário.

Em 1955, com a inauguração da extinta TV Itacolomi canal 04, atuava em teleteatros, levado por seu pai, Otavio Cardoso, que foi convidado para montar e dirigir o elenco de teleteatro daquela emissora onde permaneceu por 14 anos, até sua extinção.

Participou de vários espetáculos como, por exemplo, o famoso “Grande Teatro Lourdes”, ao lado de grandes atores tais como: Ary Fontenelle, Lady Francisco, Rogério Falabella, Mauro Gonçalves (o Zacarias dos Trapalhões), Antônio Naddeo, Elvécio Guimarães, Ana Lúcia Kathá, Clausi Soares, Glória Lopes, Ricardo Luiz, Jacy Campos (no famoso programa Câmera Um),e vários outros grandes atores e atrizes.

Atuou também como Double na Herbert Richer’s no Rio de janeiro, onde residiu por muitos anos ao lado de Sadi Cabral, Carlos Imperial, e outros

Participou como cantor em programas musicais ao lado Clara Nunes, Agnaldo Timóteo, Bando dos Cariúnas (Grupo musical do Professor Elias Salomé), bem como atuou como cantor lírico na ópera O Verter de Verdi produzida pela Sociedade Coral de Minas Gerais pela temporada lírica de Belo Horizonte comandado por seu pai que ali atuava como regisseur.

Atuou ainda, já nas décadas de 80, 90 e 2000 nas peças “Pobre Vila Rica” de autoria de Carl Schumacher pelo projeto “Caminhos da Liberdade” produzido pela Secretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais em 1989, “A Paixão de Um Deus” de Jair Raso em 1999 e “Lola”, adaptação livre para musical baseado na obra de Fassbinder, por Roberto Cordovani.

Juntamente com Magdalena Rodrigues, Presidenta do SATED/MG (Sindicato dos Artistas), produziu, dirigiu e atuou no Condomínio Morro do Chapéu a peça “O Natal na Praça”, com elenco amador formado por moradores daquele condomínio residencial por ocasião das festividades natalinas.

Formado em Direito exerce a profissão de Advogado em Minas Gerais.

Sempre gostou de ler, escrever e compor poemas.  Às vezes crônica, às vezes conto. Viajando de um gênero para o outro, “Cardoso escreve contos e crônicas como quem elabora um roteiro. A sugestão da imagem parece ser mais importante que rebuscar a linguagem ou penetrar em divagações descritivas. São as situações que se encadeiam, sem perda de tempo, para surpreender o leitor em finais impressentidos. Mesmo quando, aparentemente, é possível prever a sequência, o autor inverte o jogo e, subitamente, parte para um desfecho inesperado, um típico “golpe de cena”, que os dramaturgos conhecem de sobejo” , escreve Jota Dangelo na apresentação do seu livro CONTOS.

 E foi este livro que o Sérgio nos “presenteou”, depois que ficamos nos conhecendo em encontro das Artes (e da cerva...) na rua Grão Mogol, no Carmo. Lugar bacana, gente bacana, ótima música, e tudo mais...



E , claro, depois que ele conheceu o SBC, nosso conceito de BEM VIVER, e se identificou imediatamente.

Então, lemos o livro de uma “sentada” só, e fizemos  apreciações sobre cada um dos sete contos, especialmente este:

O CAVALHEIRO E A DAMA ou TIMIDEZ e HONESTIDADE, inusitado, excitante como as coisas “proibidas”. Então pedimos para publicá-lo no nosso projeto ARTES NA PANDEMIA. E aí está, para o nosso deleite.

 Obrigada caro amigo SBCense.



 O trem, afinal, encostou à plataforma com toda a sua característica zoeira.

O Homem desviou o olhar da Mulher e travou a batalha dos lugares. Venceu. Ajeitou-se, cansado pela refrega, na poltrona suja.

Por mero acaso, a Mulher estava à sua frente, num assento virado ao contrário (o tal “cara dura”), tendo à esquerda um cidadão.

O trem partiu. Ele cochilou. Quatro estações adiante,

desceram os cidadãos: o da esquerda e o da direita, dela e dele, respectivamente.

O Homem – por simples gentileza – ofereceu à Mulher o assento ao seu lado (direito, junto à janela): -É desagradável, minha senhora, viajar nesse banco “cara dura”. Viramos mira dos demais.

A Mulher concordou; agradeceu, e passou-se para o lado dele, é claro.

Por longo tempo não mais se falaram. Ele fingia dormitar; ela não fingia nada.

Por fim, o Homem abriu os olhos e a Mulher – por educação, ofereceu-lhe um sanduíche diminuto: pão, alface, bife, salsicha, tomate, dois ovos e mostarda.

— Não, muito obrigado. Estou sem fome, disse o Homem. E comeu o sanduíche.

— Horríveis aqueles camaradas que desceram, disse a Mulher. Antipáticos, sem assunto e mal cheirosos; não lhes dei a mínima confiança.

— Concordo, concordo, sem dúvida, com a sua opinião, falou o Homem, lembrando-se de que a Mulher e os cidadãos haviam conversado o tempo todo.

— O senhor está com bastante sono, não? – perguntou a Mulher – pelo menos dormiu bastante.

— Sim, respondeu o Homem. Ando muito sem sono.

— Depois – continuou – sou um tanto acanhado e não sei bem iniciar uma conversação.

Assim, prefiro dormir nas viagens, concluiu passando o braço casualmente por trás dos ombros da Mulher.

— Aprecio homens acanhados, disse a Mulher. Eu, na qualidade de casada, honesta e fiel, não aprecio homens “entrões” . E ajeitou-se melhor no braço do Homem.

— É casada? Perguntou o Homem, com evidente surpresa, pois já havia visto a aliança grossa e brilhante no anular esquerdo da Mulher. Então, conte comigo para despachar audaciosos que a queiram desrespeitar, acrescentou enquanto apertava-a suavemente de encontro a seu peito.

— Vê-se logo que é um cavalheiro, articulou a Mulher. Sinto-me segura e protegida a seu lado, uma vez que é indivíduo que não abusa. Sou também muito tímida e encostou sua face na dele.

— Muitas vezes surpreendo perguntando-me como pode haver tipos avançadores (de desodorante Avanço), expressou-se o Homem, examinando delicadamente a contextura do tecido que a vestia nas partes mais anatômicas.

— Bem grande esse túnel, gaguejou a Mulher, ao conseguir libertar a boca que o Homem beijava ainda. Meu marido, sempre me diz ter desagradáveis impressões ao passar por túneis.

— De fato, há indivíduos sem vergonha que se aproveitam da escuridão para

atitudes pouco recomendáveis e desrespeitam senhoras por acaso ao seu lado, tartamudeou o Homem, enquanto fazia discreto “bilu-bilu” na Mulher.

— Não tolero tais camaradas, ciciou a Mulher. Costumam até fazer-nos indecorosos convites.

— Isto é verdade, disse o Homem e conceituou distraído:

conheço um desses descarados, que certa vez, teve a audácia de convidar distinta dama com quem viajava, para interromperem a viagem e pernoitar com ele na primeira estação onde desceria, alegando,

veja a senhora que desfaçatez – o fato de estar muito frio . E, assim falando, o Homem media o diâmetro das pernas da Mulher.

— A um convite de tão baixa espécie, articulou a Mulher reunindo sua bagagem – não seria possível resposta digna.

— Lógico, disse o Homem, descendo do trem. Felizmente sou bastante reservado para tentar tal aventura.

— E teve a sorte de viajar ao lado de uma senhora correta, sempre pronta a rebater qualquer insinuação descabida, exclamou a Mulher, ao entrarem no Hotel.

— Perfeitamente, sem dúvida, sem dúvida, - falou o Homem – e por isso me felicito, concluiu ao assinar o livro de registro com o seu verdadeiro nome falso.

— Imagine se eu me prestasse ao que se prestam essas... “quaisquer” que andam por aí... ciciou a Mulher entrando no quarto.

— Se assim fosse, tartamudeou o Homem, acompanhando-a, creia que a senhora não mereceria sequer minha consideração; sempre apreciei a virtude...e fechou a porta do quarto!

                                                            'FIM

Aproveitando para fazer um convite especial: A partir do dia 15 deste mês comemoraremos os 100 anos de Clarice Lispector, no mesmo lugar onde conhecemos o Sérgio.  SuperSBCence!!!

Nos encontramos lá... Até!!!

SantuzaTU



 


 

6 comentários:

  1. Muito interessante e de extremo bom gosto. Além disso,bastante divertido. De maneira leve e bem escrito nos faz divertir e aprender ao mesmo tempo. Parabéns Sérgio.

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