terça-feira, 3 de agosto de 2021

Diálogos entre Angel e Rochelle... com testemunhas

Continuando... é muito tricô...

Estávamos, cinco SBCenses, tomando umas e conversando num buteco na beira calçada e, como sempre, adoramos conhecer pessoas... bacanas. Primeiro passou o Tony, que é fabricante de semi joias. Tony achou que tinha na mesa um casal gay de mulheres, porque uma delas - vendo que ele tinha nas suas amostras uma tornozeleira com detalhe nas cores do reggae -  perguntou se ele faria uma com as cores do arco íris,   símbolo LGBTQIA+.  |Ele não fazia. Continuamos a conversar e, na despedida, ele disse pra uma de nós: linda, sua esposa. Rimos, porque não existia este casal na mesa. E ainda aconteceu uma piropa: "não é porque não quer, amor..." Um de nós contou que, há pouco tempo, presenciou uma cena triste: um homem hetero se ofender por causa de uma cantada de um gay. Comentamos que uma análise possível dessa "ofensa" poderia ser a falta de liberdade do homem hetero que escolher, ou seja, dizer não... ou SIM, talvez... e acontece também com as mulheres que se ofendem, no caso nossa SBCense até se sentiu lisonjeada.

Daí passou a Angel Rochelle... vendendo Halls... uma pessoa trans, simpatissíssima. Caímos no papo com ela também. E, em homenagem a ela, nós resolvemos que, daqui pra frente uma de nós se chamaria Angel e a outra Rochelle. Só de brincadeira. esse casal. Uma, na mesa, lembrou que, há algum tempo, quando de uma viagem em quatro mulheres a Guarapari, tinha um lugar bacanérrimo, música ao vivo, e muita paquera. Não sabíamos, ainda, do termo PIROPA, ele não tinha sido incorporado ao SBC naquela época. E quanto acontecia uma paquera chata, indesejável, "a gente, pra despistar, dava a mão uma pra outra e ia ao banheiro de mãozinha dada... nunca mais na semana toda o cara chegava... ainda bem...".

E, no tema piropa, nosso assunto mudou para piropas virtuais: "Gente! as pessoas estão desaprendendo a nossa língua? não tá dando pra entender as mensagens nos sites de relacionamento! Primeiro, não existe ponto de interrogação! então você não sabe se a pessoa está perguntando!. Depois, a letra D foi abolida e não me contaram? tipo: tô chegano... Outra: Vc quer que leve auguma coisa? (isso quando a piropa já estava evoluindo para um encontro...  e assim por diante... nossa língua está sendo massacrada!". Ai ocorreu a consideração de SBCense na mesa: "Gente, considerem o fato de que, no Brasil, pouquíssimas pessoas tiveram e têm acesso à educação formal. Os erros de português refletem a falta que da educação num país como o nosso. Milhões de pessoas são "educadas" de uma maneira bem rude, bem elementar. Poucas pessoas têm acesso a educação que permite a escrita, digamos, correta. A elite, na verdade. E, outra coisa, não saber escrever direito não corresponde a falta de inteligência, pois a inteligência emocional se situa para além de "escrita correta"...".

E as mulheres à mesa perceberam que precisavam pensar mais, talvez sobre o que poderia estar por trás desse "preconceito" com os homens que "não estão sabendo escrever". Pensamos que temos expectativas que possamos conversar, nós, mulheres e homens. Nós temos "tesão intelectual",  queremos, sim, conversar sobre "visão de mundo", sobre "política" na cama e no mundo. Se não dá pra fazer isso perdemos o tesão. "Como outra dia numa conversa tinderiana, o cara queria conversar mas só dizia bom dia, boa tarde, boa noite. Aí eu disse: se vc quiser conversar, abra um assunto!. Ai ele respondeu: "vc é mto inteligente!" e pronto! não conversou mais...".

E um homem na roda colocou sua percepção sobre o masculino: "Do que conheço sobre nós, pouquíssimos homens gostam de conversar. Infelizmente, ainda hoje, a maioria de nós permanece no "Cala a boca e beija". Triste..."

Daí, falamos sobre o amor: "tá vendo, ele termina o namoro e continua te mandando foto e mensagens... é porque ele ainda te ama..." . E ouvimos uma resposta certeira: "Não acredito! pra mim, o amor é uma emoção construída, amor não é isto que a gente aprende, no meu entendimento. As emoções são artefatos culturais, a gente aprende o que é amor... e o que a gente aprende sobre o amor é muito distorcido! Amor é construção, dá trabalho! Não está fora da gente, nós não sofremos o amor, nós somos ativos no amor! Ele está dentro da gente! Mas gente aprende a nos ver como passivos, como "sofrendo" o amor. Mas o amor é ativo... dá trabalho, como disse.  E pouca gente se interessa por isso!"

E o assunto se ampliou: "Um nível de consciência próximo ao senso comum não dá! Porque este nível de consciência reproduz machismos, racismos, preconceitos, dominação, exploração... tudo isso próprio de uma cultura capitalista. Precisamos conversar muuuuitooo sobre isso, de uma maneira simples, coloquial, que atinja pessoas "educadas", que saibam escrever bem mas apresentam uma visão de mundo "distorcida", "empobrecida"; e pessoas que não sabem escrever direito e também reproduzem essa visão de mundo. Precisamos compreender historicamente o mundo que vivemos, o capitalismo, e como ele afeta nossas vidas e nossas relações...". "Outro dia mesmo conversei com uma pessoa que sabe escrever direitinho! essa pessoa tem mais de 50 anos... e ela ainda acha que o comunismo vai confiscar seus bens, sua "propriedade" (leia-se "seu ap"); que comunista "come crianças"!!! (pros mais jovens, essa era uma ideia disseminada nos anos 50 e 60, pós 2a guerra, quando a "guerra fria" era o confronto EUA x URSS; hoje esse confronto é com a China... precisamos buscar mais informações sobre a China... e sobre outros países "comunistas"...  que o comunismo vai confiscar seus bens, sua "propriedade" (leia-se "seu ap")...

E uma grande SBCence na mesa tinha acabado de ver um filme sobre e assunto e compartilhou conosco: "Vocês conhecem Michael Moore? Michael Francis Moore é um documentarista e escritor norte americano, conhecido pela sua postura crítica, sobretudo em relação à violência armada da sociedade americana, às grandes corporações, às desigualdades econômicas e sociais e à hipocrisia dos políticos, tendo sido particularmente crítico a George W. Bush e à invasão do Iraque em 2003". 



Eu o conheci com o filme Tiros em Columbine, de 2002, quando ele tenta descobrir por que a busca da felicidade americana está cheia de violência,  explorando os acontecimentos que resultaram na tragédia na Columbine High School em 1999. Foi o Oscar de melhor documentário em 2003.

E,  em 2009 ele faz o filme documentário "CAPITALISMO: UMA HISTÓRIA DE AMOR",  que vimos agora, atualíssimo... Já sabemos que crises econômicas não se limitam aos aspectos financeiros, afetam a vida da maioria dos cidadãos e cidadãs... e podem despertar nxs mesmxs os questionamentos sobre o próprio sistema econômico. Moore faz uma análise do sistema capitalista neste seu filme, bem como os fundamentos econômicos que sustentam o regime capitalista e as consequências terríveis da sua expansão irrefreada. Várias cenas do filme documentário suscitam reflexões muito pertinentes a respeito da lógica do regime capitalista.





E perguntamos: o que ficou de marcante no filme para este SBCense? o que mais te afetou? 

E a resposta:

. O capitalismo é um sistema que dá e tira... tira mais do que dá;

. O capitalismo tira proveito dos infortúnios dos outros... tudo dentro da "legalidade" (isso significa que o direito está a serviço do capitalismo, ou seja, dos ricos ficarem mais ricos às custas da exploração dos pobres, que ficam cada vez mais pobres);

. O capitalismo é um sistema baseado na livre iniciativa; na motivação do lucro; e na competividade;

. Mas no capitalismo temos a "democracia", temos "liberdade" para "vender" nossa força de trabalho. Mas vender a que preço? a valores de mercado, lógico! então: liberdade para nada!...

. Quando um empreendimento é entregue à iniciativa privada, as pessoas se transformam em OBJETO (de lucro);

. Fica elucidado, no filme, como algumas empresas, no capitalismo, se beneficiam com a morte das pessoas;

. O capitalismo é injusto: vai contra o bem comum; a solidariedade, a compaixão... vai contra valores cristãos... é perverso, obsceno, imoral;

. Mas a repetição vai incutindo nas nossas cabeças que é bom, que é justo, que é desejável!

E, se esse filme nos causou impacto e reflexões, e ele foi realizado há mais de 10 anos, nós "atualizamos" com o Oscar de melhor filme deste ano, NOMADLAND, que também, no nosso entendimento, trata-se de uma denúncia importante feita a esse sistema em que nós vivemos e que, de alguma forma, nos aliena e nos faz reproduzi-lo. 

Chloé Zhao é a diretora do filme, a segunda mulher (e primeira asiática) a ganhar a categoria de direção, e Frances McDormand se tornou a primeira pessoa a ganhar o Oscar tanto como produtora quanto como atriz do mesmo filme. O filme conta a história de Fern, uma mulher de 60 anos que, após colapso econômico na sua cidade na zona rural de Nevada nos EUA, entra na sua Van e parte para a estrada, vivendo uma vida fora do "sistema" (que a explora até a "inutilidade" e depois a "joga fora", a exclui)c. E foi como uma nômade que ela encontra amigxs,  esperança e liberdade, além da solidariedade que existe nas comunidades, para além da competitividade e da individualidade reforçadas no sistema capitalista. Fica, ao final do filme, a sensação de que um modo de vida incomum, eu diria, mais humano,  foi apresentado com louvor, sem romantizá-lo ou demonizá-lo.

E, ao final do nosso encontro, fica a sensação de urgência de  mais conhecimento que nos faça criticar o mundo em que vivemos, como nós o reproduzimos através dos nossos preconceitos, racismos, machismos, misoginias, polarizações... e como a arte pode nos ajudar... outros filmes virão... livros... poemas... que nos ajudarão a criticar e nos instrumentalizar para conversarmos e caminharmos na construção de um mundo melhor, relações mais bonitas.

E, pra fechar, uma pessoa na roda apresentou post do insta que foi, mais ou menos, a síntese do nosso encontro:



Até...

SantuzaTU



2 comentários:

  1. Parabéns pela iniciativa: compartilhar questões, impressões, críticas, e reflexões com afeto!!!!

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