quinta-feira, 17 de agosto de 2023

O assunto da semana no SBC: Vamos conhecer o MST?

 

João Pedro Stedile, atualmente com 69 anos, é um economista e ativista social brasileiro. Graduado em economia pela PUC do Rio Grande do Sul e pós-graduado pela Universidade Nacional Autônoma do México. Coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Stedile atua na causa da Reforma Agraria, Agroecologia e das causas populares.

E o livro que ele cita no seu depoimento na CPI do MST no dia 15.agosto, nesta terça-feira, SELVA, de Alexandre Saraiva, ex-delegado da PF, narra operação de maior de apreensão de madeira ilegal no pais, que derrubou o então ministro do meio ambiente Ricardo Salles, no governo Bolsonaro. Salles, agora, Depurado Federal e relator dessa CPI do MST.

Esse depoimento histórico foi uma verdadeira aula:  traz, de uma maneira transparente, duas visões de mundo que se relacionam com uma discussão que, embora não seja atual, é urgente para o futuro do Brasil. Ora, muitos e muitas de nós do SBC já presenciamos ou ouvimos relatos de tentativa de reforma agraria no nosso país. Me lembro muito bem de João Goulart... e, para os mais novos, é só dar uma olhadinha do google:

"...Governo João Goulart foi de 1961 a 1964 e ficou marcado na história brasileira por ter sido um mandato abreviado por conta do golpe civil-militar de 1964. Esse governo ficou marcado pela radicalização e instabilidade política. As tentativas de reforma (entre elas a reforma agrária) conduzidas pelo presidente eram impopulares entre as elites, que eram, naquele momento, apoiadas pelos norte-americanos, e que se organizaram com os militares para derrubar o presidente e instalar uma ditadura".

Assim como no google também temos informações sobre o MST. A seguir um resumo:
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é um movimento de origem social que defende a reforma agrária no campo brasileiro. Ele surgiu em um contexto histórico-econômico marcado pela luta da sociedade civil organizada em prol da democracia e possui uma função importante em defesa das populações campesinas brasileiras.

O MST é um movimento de origem popular, ligado ao campo brasileiro, que tem como objetivo promover a luta dos trabalhadores rurais em prol da reforma agrária (redistribuição mais justa das terras). Esse agrupamento, principal movimento social do país, tem como enfoque as questões ligadas ao espaço rural, com destaque para a defesa da melhor distribuição de terras, em oposição ao cenário de concentração fundiária que prevalece no Brasil.

Assim, nesse contexto, o principal objetivo do movimento é o estabelecimento de uma política de reforma agrária no campo brasileiro. No entanto, ao longo das décadas, novas discussões foram sendo incorporadas à luta do MST, como a defesa da agricultura familiar, da agroecologia e da preservação ambiental.

A origem do MST data de décadas anteriores, e foi alimentada pelo agrupamento de entidades autônomas, com destaque para a participação da sociedade civil organizada ligada ao campo brasileiro. A data oficial da fundação do MST é janeiro de 1984.

Nesse marco histórico, ocorreu o 1º Encontro Nacional de Trabalhadores Sem Terra, na cidade de Cascavel (Paraná). Esse encontro possibilitou a fundação das bases ideológicas e práticas do MST enquanto um movimento social civil organizado que tem como objetivo a promoção da reforma agrária no Brasil.

Destaca-se que o contexto histórico de fundação do MST está ligado, primeiramente, ao período do governo militar no Brasil, marcado pela ainda maior concentração de terras no campo brasileiro. O movimento não concordava com a forma de distribuição de terras realizadas pelo governo federal brasileiro da época. Ademais, o surgimento do movimento está ligado ainda ao processo de redemocratização brasileiro, em um momento de luta pela volta da democracia e pela maior participação da sociedade civil no governo.

Enfim, o SBC assistiu esse depoimento como se fosse um filme, ou uma aula... e aprendemos muito:


. Aprendemos que existem movimentos que promovem acumulação, e, de alguma forma, sabemos quem financia esses movimentos; e existem movimentos lícitos, que enfrentam as desigualdades sociais e promovem uma maior distribuição;  e estes movimentos sofrem tentativas de criminalização, e é o que a CPI vem tentando...

. Aprendemos, também, que essa tentativa é feita a partir de raciocínios que tomam parte pelo todo, a fim de gerar acusações infundadas, gerar "verdades fabricadas"; como uns poucos depoimentos mostrados para demonstrar o "miserê" e a exploração em acampamentos, quando a realidade é a de 500.000 famílias em 5.000 assentamentos, como foi explicado e, inclusive, com o convite reiterado aos parlamentares para visitarem alguns assentamentos.

. Aprendemos com citação de Marx, e com o exemplo de pessoa estudiosa do mesmo no tempo da ditadura, o ex-ministro Delfim Neto, sobre o termo "lupem" (no alemão: trapo, farrapo, pessoa desprezível): pessoas desprovidas de consciência de classe e consciência política, que podem servir aos interesses de outra classe social a qual elas não pertencem. O cinismo e a absoluta ausência de valores podem contaminar toda a consciência de uma classe em que elas estão inseridas e que se pretende revolucionária. Pois bem, todo movimento ou todo grupo social, e o MST não está fora disso, é susceptível ao "lupesinato", e este tipo de oportunismo é combatido, segundo depoimento do Stedile, com princípios organizativos importantes, quais sejam: tudo é lidado e resolvido no coletivo, através de comissões; a divisão de tarefas e clara e comprometida, todo mundo lava prato, por exemplo; a disciplina e rígida, o combinado é cumprido; e, por último, ESTUDAR é uma prioridade em todo o movimento, trata-se de regra básica o combate à ignorância. 

Inclusive o Programa Nacional de Educação  na Reforma Agrária - PRONERA, foi criado em 1998, no tempo da governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, tendo na liderança dessa construção a primeira dama Dona Ruth, com o objetivo de proporcionar educação aos jovens e adultos em situação de reforma agrária. O que diferencia o PRONERA das demais políticas públicas é o seu caráter participativo que não só o originou como também faz parte de seu funcionamento.


. Aprendemos, muito, também, sobre a agricultura brasileira e seus modelos:

Nos últimos 30 anos , disse Stedile, "...a agricultura brasileira se confronta em três modelos de exploração da agricultura. O primeiro é o latifúndio, não como sinônimo de grande propriedade, mas como modelo"... "é um modelo em que o capital é predador da natureza, ele não se interessa em produzir, quer se apropriar dos bens da natureza para acumular riqueza".

O segundo modelo, seguiu Stedile, "... é o agronegócio: são grandes propriedades que usam técnicas mais avançadas de sementes transgênicas, mecanização e agrotóxicos. Produzem o quê? Produzem commodities para exportação, que não necessariamente representam distribuição de riqueza".

(Na prática, produz riqueza concentrada e gera pouco emprego. De acordo com o Censo Agropecuário do IBGE de 2017, havia 15,1 milhões de trabalhadores em atividades agrícolas, sendo dois terços na produção familiar. Os demais, 3,9 milhões, eram assalariados e apenas 40% tinha carteira de trabalho assinada. No total, aproximadamente 10% tinha empregos formais. Comparando-se com os dados de 2006, a população ocupada no meio rural caiu de 16,5 milhões para 15,1 milhões - estes dados encontramos em artigo publicado no "Outras Palavras" por Glauco Faria.

Continuou Stedile; "Uma parcela do agronegócio eu acredito que 'vai para o céu', porque elas estão se dando conta de que podem ganhar dinheiro e aumentar a produtividade com outras práticas", o que ele chamou de agricultura consciente, ou regenerativa. "Agora, o agronegócio que só pensa em lucro está com os dias contados.

"O outro modelo é a agricultura familiar, que se dedica a produzir alimentos que, em geral, não usam agrotóxicos e é respeitoso ao meio ambiente, sabe que não pode derrubar árvores".

O que nos pareceu óbvio nessa "aula" é a conexão - negada por uma elite brasileira desde nossa história de "colonização" - da atividade agrícola realizada de forma predatória com grandes prejuízos ao meio ambiente que, a médio e longo prazo, inviabilizam a própria produção, ou seja, uma "cobra que morde o próprio rabo". Esse modelo, que ocorre em outros níveis na nossa sociedade, ou caminha para ser substituído por modelos baseados numa distribuição mais justa, maior solidariedade e humanidade, ou caminhamos para o autoextermínio...

Por fim, a CPI foi extremamente elucidativa sobre a questão da REFORMA AGRÁRIA aqui no nosso país, e a enorme resistência histórica de uma elite brasileira a esta reforma, elite essa representada ali naquela CPI e no parlamento,  em sua maioria: Ficou evidente que, efetivada a Reforma agrária - que consta na nossa Constituição de 1988 - o MST poderá deixar de existir... e que essa reforma é um fato tanto nos EUA quanto na China, dois países opostos ideologicamente.

Daí concluímos sobre a necessidade de representatividade ...  e de luta pelos direitos,  dos negros, dos povos originários, das mulheres, do povo do campo ... enfim, dessa população brasileira tão secularmente explorada e submetida aos desmandos de uma elite predatória. E que essa representatividade não se restrinja à "lutas identitárias", que esteja ligada à luta maior, a luta de classes, à luta por um  Brasil - e um mundo - mais justo, mais equânime, mais solidário e mais bonito.  Enfim, essa CPI também escancara a estratégia dessa elite ali representada, que não se resume a criminalizar o MST, mas os princípios que ele defende: a promoção da reforma agrária e e combate à pobreza no campo. E essa questão é algo que não diz respeito somente ao campo, mas também à cidade, já que o alimento consumido na cidade se relaciona com a distribuição das propriedades rurais e à forma como ele é produzido. "A redução efetiva da desigualdade no país passa necessariamente por aí", como termina aquele artigo citado no "Outras Palavras".


Por fim, encontramos uma entrevista do Stedile de 2012 no Programa Provocações, naquela época conduzido pelo grande Antônio Abujamra. Tem, também, uma aula dele no ICL(Instituto Conhecimento Liberta)... para quem se interessar.


Abraços a todos e todas e até nossa próxima provocação, também, junto com Stedile: ESTUDEMOS!!! BUSQUEMOS CONHECIMENTOS PARA ALÉM DO PRONTO E QUE NOS É ENFIADO GOELA ABAIXO! ENFIM, PRATIQUEMOS A CONSCIÊNCIA CRÍTICA! E NOS LIBERTEMOS DESSA DOMINAÇÃO CULTURAL QUE NOS É IMPOSTA!







10 comentários:

  1. Muito bom! Muito obrigada por compartilhar!

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    1. que bom que você gostou Ingrid. Continue nos lendo viu? abraços... SantuzaTU

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    2. Muito bom o artigo, Santuza! O Stedile, como sempre, muito firme e didático em suas posições, calou os representantes do agronegócio, e mostrou para quem teve o privilégio de assistir, o que o MST propõe como solução para o problema agrário brasileiro.
      Obrigado por trazer à baila essa discussão.
      Juraci Bergamini.

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    3. obrigada pelo comentário, Juraci...
      Santuza

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  2. Obrigada pela síntese.

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  3. Obrigada aos retornos dos "anônimos" no nosso blog. Solicito aos mesmos que, ao postarem anonimamente, coloquem seus nomes na mensagem. Obrigada, SantuzaTU

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  4. Santuza, magnífico. Você fez o que todos queríamos fazer: registrar as palavras de Stedile, uma montanha de coerência política e social. Obrigada

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  5. Este anônimo sou Sara Kanter

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