sábado, 27 de agosto de 2016

conversas sbcenses: quando me deixo ser afetadx vou transformando minha vida

Nos nossos riquíssimos encontros aprendemos tanta coisa boa prá vida!
Uma delas é rir... rir desoxida talentos... outra é fazer pesquisas antropológicas... já sabem de que se trata? No SBC não fazemos fofoca, somos contra... fazemos boas pesquisas antropológicas... rsrs

Mas hoje quero falar do exercício de compartilhar coisas que "mudam a vida", por exemplo, a musica da minha vida, o filme da minha vida, o livro da minha vida... e assim por diante.

Então, tenho a compartilhar "a metáfora da minha vida": ouvi do nossa grande educador Rubem Alves, ele disse: essa estória não é minha, meu é só o jeito de contar... e eu também começo assim, já com o meu jeito de contar... não dizem que "quem conta um conto aumenta um ponto"? pois é... cada vez que conto essa metáfora acrescento uma coisa diferente, até personagem (a do médico...) já acrescentei... isso porque cada vez que conto recebo também referências para novas reflexões TAP (conto mais tarde o que é isso...) ... e assim vamos exercitando a arte relacional que é crescer com a troca... crescer com as reflexões do outro, assim como oferecer ao outro as minhas reflexões.

Vamos à metáfora: não se sabe porque... se um acidente, uma experiência científica... não sabemos os antecedentes... o fato é que a estória começa com o ovo de uma águia indo parar num galinheiro... junto com os ovos de uma galinha... a galinha veio, sentou em cima dos ovos, chocou... e nasceram alguns pintinhos... e a águia... a galinha nem percebeu e começou a criar seus pintinhos... e a águia foi crescendo no galinheiro... e foi aprendendo o jeito de ser de galinha... aprendeu a dormir em poleiro, comer milho, cacarejar... e foi crescendo... águia adolescente... super complexada... o bico foi ficando torto, as pernas grandes demais... estava tão complexada que resolveu ir num médico... no galinheiro só tinha medico do SUS (não os cubanos... e também não generalizando)... 3 minutos de consulta... sabe o profissional que vê parte e não vê todo? o médico que vê o braço e não vê a pessoa, o engenheiro que vê a arvore e não vê a floresta... pois é... este nem olhou para a águia esquecida... já foi dando um monte de pedido de exames... volte quando estiverem todos em mãos... a pobre águia esquecida saiu pior do que entrou... mas foi fazer todos os exames, pois queria saber o que ela tinha! pois ela acreditava que estava com uma perturbação hormonal ou coisa parecida... tudo que ela queria era que o cocô dela tivesse o cheiro certo de cocô de galinha, até isso ela achava que estava errado (segundo o Rubem Alves, que me contou essa parte da estória).
Pois bem... uma semana depois a águia esquecida voltou e apresentou ao médico todos os exames... novamente ele só olhou os exames... e disse: trata-se de uma doença rara: acromegalia... tudo grande demais... é não tem solução... o jeito é você ir se acostumando... e só... Ô dó!!! a pobre águia esquecida saiu ainda pior... mas fazia um grande esforço para se adaptar, afinal tinha alma de galinha...
Um dia apareceu no galinheiro um alpinista... uma pessoa que conhecia os lugares mais altos do mundo e o voo orgulhoso das águias... e então aconteceu o seguinte diálogo inusitado:
- o que você está fazendo aqui?
- como assim!!! eu nasci aqui... sou uma galinha!!!
- que isso!!! você não é uma galinha!!! é uma águia!!!
- de jeito nenhum!!! sou uma galinha!!! durmo no poleiro, como milho, cacarejo...
- Não!!! você é uma águia! eu conheço águias!!! você é o pássaro que voa mais bonito no mundo!!!
- De jeito nenhum!!! nem voar eu sei!!! na verdade nem quero... a altura me dá vertigem... é mais seguro ir andando, passo a passo...
E não houve argumento que mudasse a cabeça da águia esquecida...
Então o alpinista, vendo aquela coisa triste (nada contra galinhas...mas um ser transformado em outro ser...) ficou pensando o que ele poderia fazer para ajuda-la, para que ela se descobrisse. E teve uma ideia radical... e resolveu colocar sua ideia em prática imediatamente... agarrou a águia e enfiou a mesma num saco e "roubou" a águia do galinheiro... e já começou a escalar a montanha mais alta que ele conhecia... com o saco nas costas... subiu... subiu... subiu... chegou no pico mais alto da montanha... sentou, descansou... segunda metade do plano... abriu o saco... a águia cacarejava de pavor... mas ele não teve compaixão... chegou na beira do precipício e jogou a águia no vazio do abismo.
E foi então que uma coisa muito esplêndida aconteceu: a águia começou a cair... a princípio em pânico, batendo as asas de maneira totalmente descompassada... ela não sabia que sabia voar... pouco a pouca, ainda na queda, como se memórias morassem em seu corpo, as asas foram adquirindo estabilidade... e, em vez de esparrachar lá no chão ela fez um rasante...como se memórias morassem no seu corpo...  ela voou... esplendidamente...
Foi seu primeiro voo... e ela descobriu que seu nome não era galinha... era águia... e descobriu aquele espaço enorme que lhe tinha sido roubado... e encontrou outras águias que voaram junto com ela lá no céu...
E o alpinista ficou ali vendo essa cena... um ser se descobrindo... e se sentindo feliz de ter contribuído prá isso...


Agora o TAP: começando por Goethe: de resto abomino tudo que me inspira sem me impulsionar diretamente para a ação... Isto significa que qualquer coisa que já existe (um filme, um livro, uma música, uma metáfora) é o resultado de um processo do autor... e só vai me servir de pretexto (ou pré-texto) eu sou sujeito do conhecimento, eu construo minhas teorias, minhas metáforas e tudo que passa por dentro de mim, pelos meus afetos, me provoca reflexão e alguma mudança de ação em qualquer nível de relação (íntimo, pessoal, social e/ou público)... explicando melhor: o movimento para uma transformação na vida e a produção de conhecimento vivo é este: TAP - AT - AP e assim a vida toda... teoria é tudo que já existe pronto que foi o processo de reflexão de alguém... mas essa teoria só vai me servir, mudar minha vida, se eu fizer o exercício de AFETO, de ser afetadx pela teoria, a mesma passar por dentro de mim e me provocar reflexões... aí eu me proponho a mudar alguma ação, alguma prática de vida (em qualquer nível de relação)... e quando eu vejo isso, a minha prática transformada... isso passa de novo pelos meus afetos e eu faço novas teorias, ou seja, eu conto aquela estória já com o meu olhar... e assim vai... TAP - AT - AP... é um movimento para a vida toda.

Então... não é a estória que muda a vida... é o movimento... é se deixar afetar... quantas vezes a gente fica super sensibilizada com um filme, por exemplo... e três dias depois já esqueceu... não mudou nada na vida... ou seja, não apropriou... não fez o TAP... não cresceu...

E eu conto como a estória da águia me mudou... e que ferramentas eu usei para isso. A primeira delas:  abrir perguntas: o que essa estória me diz?... como eu me vejo? ... entre outras...
Depois eu criei uma escala invisível para fazer uma auto avaliação diária: de 0 a 10, em cada nível de relação, que nota eu me dava a cada dia, sendo que 0 seria o estado de "engalinhada" e 10 o estado "águia"... e o que eu poderia fazer para melhorar minha nota... a cada dia... de preferência naquele dia mesmo...

E, prá mim, a vida ... sempre... todo dia... é um caminhar para o estado de águia, me descobrir águia, construir relações com outras águias... assim como construir um mundo de águias... mais bonito... mais autêntico, no definição de autenticidade que vi num filme do Almodóvar: "autenticidade é quanto mais você se aproxima daquilo que sonhou prá você mesmx"... dá trabalho... mas VALE A PENA...



Abraços carinhosos...

Santuza TU

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