...Esta é Claudete Coutinho, pedagoga, psicopedagoga, psicanalista, além de escritora. Ex-professora e vice-diretora de escola pública. Trabalhou como pedagoga num presídio de segurança máxima, onde fez trabalho voluntário por cerca de 6 anos, 25 anos num instituto de serviços sociais |(INECC - Instituto de Educação e Construção da Cidadania) para menores em situação de risco, com o programa de liberdade assistida e, mais tarde, no serviço do Centro Social e Educativo de Divinópolis.
O SBC adooraaa essas pessoas múltiplas: SOMOS MUITAS!!! E DAMOS VOZ A TODAS ESSAS QUE EXISTEM EM NÓS!!!
E ela nos presenteia com o belíssimo texto a seguir. Nossa gratidão a essa (ou essas) mulher(es) maravilhosa(as), grande aquisição do SBC. Nos tempos sombrios que estamos vivendo, precisamos muuuiiito dessas trocas.
Debulharam o baguinho de feijão preto que era sua família
Maria, antes de sair, olha uma vez mais os três filhos.
Camas feitas entre os caixotes. Corre o olhar entre os seres que abrigam
debaixo do viaduto.
Seu mais velho, já quase um adulto, vai ser nego bonito
forte, alto, carinhoso.
Mas o olhar triste da agonia é visível:
- Porque nasci dessa cor da morte?
Maria trabalhadora, do serviço não foge.
Na semana, ainda bem, que a patroa vai aceitando, um dia a
falta, pelo filho doente, fila no posto, outro dia é ela que acompanhou
José nos dois goles.
Enquanto eles, burgueses, brindam em vinho, aqui é dois goles da garrafa
de pinga.
Os outros, embriagados, inebriados, se entregam na cama larga,
com lençol clarinho, cheiroso, que eu lavei e passei.
José e eu vamos fazer mais barulho, ao nos entregarmos, que
eles
Nós no papelão, mas na cumplicidade em linha direta com a lua e as estrelas.
Não temos teto entre eles, é o nosso amor.
Hoje ela sai, não sabe dizer se mais feliz ou mais agonia.
Passa mão no ventre e sente um sobressalto, vou ter outro filho.
Adeus casa da patroa, vamos mesmo é trabalhar, família unida.
Catar latinhas, papelão, recicláveis perto do Mercado Central.
Vender água nos sinais.
Vender bala na estação do metrô.
Seu filho mais velho quer vender bala na feira.
Não pode, a lei não permite.
O filho começa a roubar, a cheirar.
Debulharam o baguinho de feijão preto, que era sua família.
Cada um toma um rumo.
Só ela persiste, barriga grande, arrastando os dois menores.
Ser mãe, dignidade e vaidade, andando com a fome e a calamidade.
Maria chora, rasgada pela dor do coração.
A bolsa rebentou, é chegada a hora dela.
O carro do socorro nunca chega a tempo.
Sirenes e apitos não sabem o que é miséria.
Mas uma negra procriadora morta, é vitória. Maria expirou.
Salvo o pirralhinho.
Ele resistiu, deu o sinal do primeiro lamento.
Agora são três para enfrentar a vida,
os empregos bárbaros, a violência sanguinária, que cresce, a
justiça perseguidora, a desigualdade preconceituosa, racista.
Reclamam da violência?
Quem a pratica? Todo dia são tantas Marias, que suportam a mesma
dor.
São crucificadas pelo peso da cruz,
que carregam no tempo, a cor.
O ontem, o hoje, será que no futuro, não vão sentir mais nas entranhas?
Marias, negras, nas ruas, mulheres, mães,
os gemidos perplexos, respingados de lágrimas e sangue.
Será que não vão escutar na ressonância da voz um eco de vida e
liberdade? Ou vão abafar como nos porões dos navios negreiros?
Claumacou
Excelente reflexão! Necessário se faz que busquemos as raízes das desigualdades sociais,seguindo o princípio básico da ética reconhecer a desumanização que nós negros fomos e somos submetidos
ResponderExcluirobrigada Marcelo. Isso mesmo...
ExcluirMuito.... Muito bom mesmo!!!
ResponderExcluirobrigada Weverton...
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